Intraempreendedorismo

A relação entre remuneração e intraempreendedorismo

A forma como a política de remuneração é estruturada pode colocar um freio em iniciativas de inovação nas empresas
Alexandre Waclawovsky, o Wacla, é um hacker sistêmico, especialista em solucionar problemas complexos, através de soluções criativas e não óbvias. Com 25 anos de experiência como intraempreendor em empresas multinacionais de bens de consumo, serviços e entretenimento, ocupou posições de liderança em marketing, vendas, mídia e inovação no Brasil e América Latina. Wacla é pioneiro na prática da modalidade Talento sob Demanda no Brasil, atuando como CMO, CRO e Partner as a Service em startups e empresas de médio porte, desde 2019. Atua também como professor convidado em instituições renomadas, como a Fundação Dom Cabral, FIAP e Miami Ad School, além de autor de dois livros: "Guide for Network Planning" e "invente o seu lado i – a arte de

Compartilhar:

Quando o assunto é intraempreendedorismo, automaticamente vêm à cabeça palavras-chave como inovação, tecnologia, disrupção, liderança, risco, novos negócios e crescimento. Dificilmente a palavra remuneração está entre elas. Mas acredite, deveria estar.

O ambiente corporativo como conhecemos foi constituído e regido por processos e fluxos derivados da era industrial. Controles, organogramas verticais, áreas estruturadas, descrições de cargos e responsabilidades no maior detalhe possível. Some-se a esses fatores a estabilidade, as bandas de salários, os percentuais de bônus ou participação nos resultados, baseados em indicadores sobre os quais os colaboradores têm baixa ou nenhuma influência direta, o que gera acomodação e baixa tolerância ao risco.

Repare que as empresas estabelecidas têm como objetivo a preservação dos negócios e o lucro, logo serão evitados movimentos mais audaciosos e bruscos em busca de crescimento, que podem colocar em risco o que já foi conquistado.

Essa lógica, que existe há décadas, demanda objetivos estruturados e muitos alinhamentos, cascateados de cima para baixo e que funcionam quase como um receituário a ser cumprido. Acontece que a dinâmica entre economia, sociedade, cultura e negócios mudou e muitas práticas precisam ainda serem atualizadas e a remuneração é uma delas.

Vale ressaltar que é sabida nas empresas a necessidade e a importância de constantes mudanças e evoluções dos negócios. Por outro lado, alterações constantes de curso vão gerar desconforto em um músculo desenvolvido no planejamento, alinhamento e controle

Não há incentivo. Geralmente há receio ou punição para a tomada de riscos, que podem resultar em alguma falha. E não existe inovação sem a tomada de riscos e falhas no processo. Temos, portanto, um paradoxo.

Case real. Em uma empresa multinacional, o head de inovação foi responsável, no mesmo ano, pelo lançamento de dois produtos inovadores. Um foi o maior sucesso em muitos anos, mas o outro foi um grande fracasso. Adivinha o que aconteceu?

Ele foi penalizado pela falha financeiramente, não recebendo mérito nem seu bônus anual. Repare que ele também liderou o maior sucesso de inovação no mesmo ano, mas a falha teve um peso infinitamente maior.

Como resultado, esse executivo, no ano seguinte, evitou tomar riscos. E, com isso, perderam o executivo, sua equipe, a empresa e o negócio. No ano seguinte ele cumpriu os planos traçados e saiu com seu mérito e bônus. E zero risco.

Escutei, vivenciei na pele e ainda escuto casos de contextos organizacionais de remuneração e em que assumir algum risco passou a ser um risco pessoal. Faça uma pausa agora para uma reflexão incômoda: por que seguimos praticando políticas de remuneração de “prevenção ao intraempreendedorismo”? Como consequência, as organizações estão ficando ocupadas por um exército de intraempreendedores desativados, aguardando condições para atuar, gerando crescimento e inovação.

Enquanto isso, no mundo empreendedor, onde as responsabilidades e funções são mais fluidas, esse exército de colaboradores pode gravitar entre áreas e papéis. Como startups operam em um modelo onde lucro e mercado não estão garantidos, logo precisam assumir riscos em busca de crescimento e sobrevivência. A remuneração é atrelada à performance, a falha é encarada como aprendizado e não é penalizada. Revisões de performance e remuneração são constantes e refletem as contribuições reais e com impacto de curto, médio e longo prazos nos negócios.

## E qual seria a solução?
Sou favorável que uma parcela da remuneração mensal seja variável, independente da função ou área do colaborador. Por exemplo, enquanto as equipes comerciais, por sua natureza, têm uma parcela maior de remuneração variável, as equipes de backoffice deveriam ter uma parcela menor, mas ter. Assim se cria um ambiente de interdependência e cooperação, além de maior sensação de pertencimento e coparticipação real nos negócios.

Nessa mesma lógica, acredito que o bônus ou PLR, geralmente pago anualmente, deveria ser diferido em três anos, seguindo o modelo de vesting, já praticado por algumas organizações para distribuição de ações. O pagamento anual incentiva o cumprimento de metas, mas desestimula a tomada de riscos. Ciclos de inovação não são anuais e demandam mais tempo de maturação e ajustes, logo o bônus diferido estaria a serviço do resultado do negócio no médio e não mais no curto prazo.

Esse diferimento, em um período maior, também funcionaria como um plano de retenção (importante atualmente na guerra de talentos), além de dar mais conforto para os colaboradores e intraempreendedores assumirem mais riscos e criarem uma cultura favorável à inovação.

A política de remuneração pode, portanto, ser um acelerador ou inibidor do intraempreendedorismo e da inovação.

Compartilhar:

Alexandre Waclawovsky, o Wacla, é um hacker sistêmico, especialista em solucionar problemas complexos, através de soluções criativas e não óbvias. Com 25 anos de experiência como intraempreendor em empresas multinacionais de bens de consumo, serviços e entretenimento, ocupou posições de liderança em marketing, vendas, mídia e inovação no Brasil e América Latina. Wacla é pioneiro na prática da modalidade Talento sob Demanda no Brasil, atuando como CMO, CRO e Partner as a Service em startups e empresas de médio porte, desde 2019. Atua também como professor convidado em instituições renomadas, como a Fundação Dom Cabral, FIAP e Miami Ad School, além de autor de dois livros: "Guide for Network Planning" e "invente o seu lado i – a arte de

Artigos relacionados

Você tem repertório para liderar?

Liderar hoje exige mais do que estratégia – exige repertório. É preciso parar e refletir sobre o novo papel das lideranças em um mundo diverso, veloz e hiperconectado. O que você tem feito para acompanhar essa transformação?

Reputação sólida, ética líquida: o desafio da integridade no mundo corporativo

No mundo corporativo, reputação se constrói com narrativas, mas se sustenta com integridade real – e é justamente aí que muitas empresas tropeçam. É o momento de encarar os dilemas éticos que atravessam culturas organizacionais, revelando os riscos de valores líquidos e o custo invisível da incoerência entre discurso e prática.

Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Marcelo Murilo

7 min de leitura
ESG
Projeto de mentoria de inclusão tem colaborado com o desenvolvimento da carreira de pessoas com deficiência na Eurofarma

Carolina Ignarra

6 min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas
Como as empresas podem usar inteligência artificial e dados para se enquadrar na NR-1, aproveitando o adiamento das punições para 2026
0 min de leitura
ESG
Construímos um universo de possibilidades. Mas a pergunta é: a vida humana está realmente melhor hoje do que 30 anos atrás? Enquanto brasileiros — e guardiões de um dos maiores biomas preservados do planeta — somos chamados a desafiar as retóricas de crescimento e consumo atuais. Se bem endereçados, tais desafios podem nos representar uma vantagem competitiva e um fôlego para o planeta

Filippe Moura

6 min de leitura
Carreira, Diversidade
Ninguém fala disso, mas muitos profissionais mais velhos estão discriminando a si mesmos com a tecnofobia. Eles precisam compreender que a revolução digital não é exclusividade dos jovens

Ricardo Pessoa

4 min de leitura
ESG
Entenda viagens de incentivo só funcionam quando deixam de ser prêmios e viram experiências únicas

Gian Farinelli

6 min de leitura
Liderança
Transições de liderança tem muito mais relação com a cultura e cultura organizacional do que apenas a referência da pessoa naquela função. Como estão estas questões na sua empresa?

Roberto Nascimento

6 min de leitura
Inovação
Estamos entrando na era da Inteligência Viva: sistemas que aprendem, evoluem e tomam decisões como um organismo autônomo. Eles já estão reescrevendo as regras da logística, da medicina e até da criatividade. A pergunta que nenhuma empresa pode ignorar: como liderar equipes quando metade delas não é feita de pessoas?

Átila Persici

6 min de leitura
Gestão de Pessoas
Mais da metade dos jovens trabalhadores já não acredita no valor de um diploma universitário — e esse é só o começo da revolução que está transformando o mercado de trabalho. Com uma relação pragmática com o emprego, a Geração Z encara o trabalho como negócio, não como projeto de vida, desafiando estruturas hierárquicas e modelos de carreira tradicionais. A pergunta que fica: as empresas estão prontas para se adaptar, ou insistirão em um sistema que não conversa mais com a principal força de trabalho do futuro?

Rubens Pimentel

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
US$ 4,4 trilhões anuais. Esse é o prêmio para empresas que souberem integrar agentes de IA autônomos até 2030 (McKinsey). Mas o verdadeiro desafio não é a tecnologia – é reconstruir processos, culturas e lideranças para uma era onde máquinas tomam decisões.

Vitor Maciel

6 min de leitura