Carreira

Muito além dos programas de seleção de estágio e trainee

Universo escolar e empresas têm a oportunidade de mostrar inúmeras alternativas de carreira para jovens frustrados com o mercado de trabalho
Sabina Augras e Laura Fuks são sócias fundadoras da Cmov, edtech na área de carreira e empregabilidade.

Compartilhar:

Mesmo num ano atípico, de pandemia do novo coronavírus, somente em julho de 2020, segundo o Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), foram geradas 11 mil vagas de estágio e trainee no Brasil. Nesse contexto, grandes empresas retomaram seus programas de seleção para universitários e recém-formados. No entanto, o que parece ser uma ótima notícia do ponto de vista da retomada das oportunidades de emprego, nos traz também uma grande preocupação se analisarmos a perspectiva do número de candidatos que estão concorrendo a essas vagas.

Segundo um levantamento do “Na Prática”, iniciativa da Fundação Estudar, programas de trainee como da Volkswagen e da Whirlpool costumam contar, em média, com 700 candidatos por vaga. Já no programa da Ambev, essa relação pode chegar até 1000 candidatos por vaga. Infelizmente, essa não é uma realidade somente dessas empresas, mas da maioria das grandes corporações que oferecem programas de estágio e trainee em todo o país.

O grande ponto dessa questão é que o número de candidatos que não são aprovados nesses processos é enorme e, para piorar, suas expectativas não são alcançadas. A cada reprovação a frustração aumenta e a autoestima dos candidatos fica cada vez mais baixa. Como consequência, as chances desses jovens serem aprovados em novos processos diminuem.

O que percebemos ao longo dos nossos anos de experiência profissional em [processos seletivos](https://revistahsm.com.br/post/o-que-processos-seletivos-diversos-e-algoritmos-tem-em-comum) é que esses jovens, em grande parte, não são aprovados porque participam das seleções de estágio e trainee sem perceber que suas verdadeiras motivações não os conduzem para atuar numa grande empresa. Muitos jovens escolhem esses processos por acreditarem que esse é o único caminho possível. O pior, eles não sabem que existe um mundo infinito de possibilidades que vai além desses programas.

O problema é que um círculo vicioso foi sendo formado nas instituições de ensino, na sociedade e na cabeça da maioria dos jovens. O raciocínio, errôneo, é o seguinte: para se ter sucesso profissional, um dos melhores, ou até, único caminho possível, é através da aprovação de processo seletivo de estágio ou trainee de uma grande empresa. Surge a construção de uma lógica profissional na qual a maioria das instituições de ensino acredita que é preciso desenvolver seus alunos para estarem preparados para conseguir aprovação em grandes corporações.

A questão que gostaríamos de levantar é de como “essas verdades” podem impedir que outros caminhos de carreira também possam ser trilhados pelos jovens a partir do universo escolar. 

Convém, assim, levantar outras considerações. A primeira é, como a escola desenvolve nos estudantes as motivações que os levam a atuar no serviço público, no âmbito acadêmico, como empreendedores ou profissionais liberais? A segunda questão consiste em perguntar quais instituições de ensino preparam seus estudantes para essas diferentes direções com a crença de que elas também possibilitam sucesso profissional?

## Possibilidades de carreira: do estímulo à realidade

Um argumento consistente de que as motivações dos alunos podem ir muito além do mundo organizacional pode ser identificado no relatório realizado pelo Sebrae em parceria com a Endevor. Realizada em 2016, a pesquisa demonstrou que para aqueles estudantes que não querem empreender, 43% deles preferem atuar no setor público contra 27% que gostariam de trabalhar em grandes empresas. Este mesmo relatório apontou que dos 21% de estudantes que pensam em empreender no futuro, somente 27% cursou alguma disciplina nessa área.

Outro resultado que corrobora com toda essa discussão sobre a necessidade das instituições de abrirem seus “leques de desenvolvimento” para outras possibilidades de carreira é o resultado do teste Perfil de Carreira realizado na Plataforma de Carreiras da Cmov. 

Considerando um universo de mais de 10 mil estudantes, o levantamento indicou que a partir de suas motivações, 33% teriam o perfil para trilhar uma carreira de profissional liberal contra 10% de organizacional, 23% de acadêmico, 22% de servidor público e 12% de empreendedor. 

Nessa lógica frustrada de não [desenvolver nos jovens](https://revistahsm.com.br/post/por-que-acreditar-na-juventude) a possibilidade de escolha entre diferentes carreiras, ocorre que de um lado há jovens perdidos e frustrados por não passarem nos processos seletivos e, do outro, empresas com grande dificuldade de encontrar candidatos dentro do perfil que buscam.

Não são poucos os casos de jovens que, depois de passarem por toda essa preparação universitária, de inúmeros processos seletivos, percebem, ao serem aprovados e começarem a atuar numa empresa, que não estão felizes e que era esse o caminho de carreira que gostariam de construir. 

Em função de toda essa lógica, torna-se de suma importância que se dê ao jovem a possibilidade da pesquisa, experimentação e validação do seu objetivo de carreira frente a diferentes perspectivas. Para colaborar com esse desafio, [apontamos em outro artigo](https://www.revistahsm.com.br/post/a-angustia-dos-jovens-na-escolha-profissional) algumas diretrizes que podem ajudar os jovens e os mentores da nova geração a olhar para essas questões de uma maneira mais pontual e analítica.

Apoiar os jovens em seu autoconhecimento, ao mesmo tempo em que se possibilite abrir o leque das possibilidades de carreira, fará com que tenhamos um número cada vez menor de jovens frustrados e, consequentemente, fora do mercado de trabalho. Identificar qual é seu [perfil de carreira](https://revistahsm.com.br/post/as-amarras-da-estabilidade) e começar a se desenvolver nessa direção são os primeiros e fundamentais passos para serem felizes na construção de uma carreira de sucesso.

Compartilhar:

Sabina Augras e Laura Fuks são sócias fundadoras da Cmov, edtech na área de carreira e empregabilidade.

Artigos relacionados

Você tem repertório para liderar?

Liderar hoje exige mais do que estratégia – exige repertório. É preciso parar e refletir sobre o novo papel das lideranças em um mundo diverso, veloz e hiperconectado. O que você tem feito para acompanhar essa transformação?

Reputação sólida, ética líquida: o desafio da integridade no mundo corporativo

No mundo corporativo, reputação se constrói com narrativas, mas se sustenta com integridade real – e é justamente aí que muitas empresas tropeçam. É o momento de encarar os dilemas éticos que atravessam culturas organizacionais, revelando os riscos de valores líquidos e o custo invisível da incoerência entre discurso e prática.

Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Marcelo Murilo

7 min de leitura
ESG
Projeto de mentoria de inclusão tem colaborado com o desenvolvimento da carreira de pessoas com deficiência na Eurofarma

Carolina Ignarra

6 min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas
Como as empresas podem usar inteligência artificial e dados para se enquadrar na NR-1, aproveitando o adiamento das punições para 2026
0 min de leitura
ESG
Construímos um universo de possibilidades. Mas a pergunta é: a vida humana está realmente melhor hoje do que 30 anos atrás? Enquanto brasileiros — e guardiões de um dos maiores biomas preservados do planeta — somos chamados a desafiar as retóricas de crescimento e consumo atuais. Se bem endereçados, tais desafios podem nos representar uma vantagem competitiva e um fôlego para o planeta

Filippe Moura

6 min de leitura
Carreira, Diversidade
Ninguém fala disso, mas muitos profissionais mais velhos estão discriminando a si mesmos com a tecnofobia. Eles precisam compreender que a revolução digital não é exclusividade dos jovens

Ricardo Pessoa

4 min de leitura
ESG
Entenda viagens de incentivo só funcionam quando deixam de ser prêmios e viram experiências únicas

Gian Farinelli

6 min de leitura
Liderança
Transições de liderança tem muito mais relação com a cultura e cultura organizacional do que apenas a referência da pessoa naquela função. Como estão estas questões na sua empresa?

Roberto Nascimento

6 min de leitura
Inovação
Estamos entrando na era da Inteligência Viva: sistemas que aprendem, evoluem e tomam decisões como um organismo autônomo. Eles já estão reescrevendo as regras da logística, da medicina e até da criatividade. A pergunta que nenhuma empresa pode ignorar: como liderar equipes quando metade delas não é feita de pessoas?

Átila Persici

6 min de leitura
Gestão de Pessoas
Mais da metade dos jovens trabalhadores já não acredita no valor de um diploma universitário — e esse é só o começo da revolução que está transformando o mercado de trabalho. Com uma relação pragmática com o emprego, a Geração Z encara o trabalho como negócio, não como projeto de vida, desafiando estruturas hierárquicas e modelos de carreira tradicionais. A pergunta que fica: as empresas estão prontas para se adaptar, ou insistirão em um sistema que não conversa mais com a principal força de trabalho do futuro?

Rubens Pimentel

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
US$ 4,4 trilhões anuais. Esse é o prêmio para empresas que souberem integrar agentes de IA autônomos até 2030 (McKinsey). Mas o verdadeiro desafio não é a tecnologia – é reconstruir processos, culturas e lideranças para uma era onde máquinas tomam decisões.

Vitor Maciel

6 min de leitura