Empreendedorismo
3 min de leitura

O código fundador: por que empreender é verbo de base

Embora talvez estejamos longe de ver essa habilidade presente nos currículos formais, é ela que faz líderes conscientes e empreendedores inquietos
Fundadora da Zero Gravity Thinking. Consultora e mentora em estratégia, inovação e transformação organizacional.

Compartilhar:

 “Professora, posso sair mais cedo? Tenho um jantar com fornecedores.” 

Não é cena de série do Vale do Silício. É realidade em sala de aula, aqui no Brasil. Lecionar para uma turma de graduação na primeira faculdade focada em empreendedorismo no Brasil (a Link School of Business) é viver, diariamente, o desafio de ensinar a quem já vive a prática (e, muitas vezes, nasceu imerso nela). 

Para mim, isso tem sido um exercício constante de humildade e reinvenção. Como transmitir algo valioso para quem, muitas vezes, já testou pitches, abriu CNPJs e construiu marcas no digital antes mesmo de concluir o ensino superior? Como provocar reflexões em quem já usa o empreendedorismo como língua materna? 

O que vejo nas minhas aulas são pessoas jovens obstinadas, articuladas, apaixonadas por suas ideias. Algumas já operam ou investem em negócios que muitos executivos seniores sonhariam em estruturar. E, ainda assim, todas têm sede de algo que nem sempre o mercado entrega: o espaço para errar e aprender com profundidade. Esse é o tipo de estudante que te faz, como professora, repensar não apenas o conteúdo das aulas, mas o próprio papel da educação. 

E essa é a pergunta que tem me movido. A resposta, talvez, esteja menos em técnicas e mais em uma habilidade essencial, que deveria ser tratada como soft skill e como base da formação de qualquer profissional, de qualquer área. Uma habilidade que batizei de “código fundador”

Sempre me lembro das aulas que tive nos Estados Unidos, na University of California em Berkeley. Lá o professor era, ao mesmo tempo, investidor-anjo. As aulas se tornavam laboratórios vivos de negócios. As ideias iam ganhando forma em slides, mas também se estabelecia o networking em sala de aula, os protótipos eram desenvolvidos ainda durante o curso e aconteciam até mesmo rodadas de investimento. Isso é aprendizado com “skin in the game”, como se fala por aí. 

Ponte tímida

No Brasil, essa ponte entre academia e empreendedorismo ainda é tímida. Mas temos histórias marcantes. Em Minas Gerais, por exemplo, a Miner, empresa de metabusca fundada em 1998 e adquirida pelo grupo da Folha /UOL em 1999, foi tema de uma tese de dissertação de mestrado, e cocriada com o professor emérito da UFMG, Nívio Ziviani (que também tive o privilégio de conhecer na Fundação Dom Cabral).

Em 2000, com a experiência do Miner, foi criada com outros professores a Akwan, empresa na área de busca, e a única a ser adquirida pela Google Inc. fora dos Estados Unidos, em 2005. Isso mesmo, o Google. Ela se tornou também o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento do Google na América Latina. Ziviani já criou cinco empresas, sendo que quatro foram adquiridas (a último pelo Grupo Bradesco). Isso deveria nos dizer algo. 

Nosso desafio como educadores, gestores e líderes não é apenas ensinar a empreender, mas ajudar a despertar e desenvolver o “código fundador” em cada um. Porque esta é uma habilidade que transcende qualquer CNPJ: é sobre criar algo ao mapear incertezas, sobre olhar para o caos e enxergar possibilidades. É também sobre liderar com propósito, aprender rápido e, principalmente (e talvez o mais difícil), incentivar e assumir riscos conscientes. 

Hoje, vivo do outro lado da mesa, empreendendo. Mas empreender não é exclusividade de quem abre empresas. Isso é algo que deve estar presente em quem redesenha processos dentro de empresas, de quem inova em serviços, de quem repensa modelos de educação ou cria soluções para o agro ou qualquer outro segmento do mercado. Empreender é uma maneira de encarar o mundo com coragem, intenção e responsabilidade. 

Talvez ainda estejamos longe de ver o “código fundador” presente nos currículos formais, mas sigo aprendendo com cada aluno, a cada aula, e em cada troca que me desafia a desaprender para poder ensinar de outro jeito. E buscando também na minha atuação profissional ajudar a formar profissionais mais inquietos, e líderes mais conscientes e preparados para lidar com o inédito não apenas nos negócios, mas na vida. 

Compartilhar:

Fundadora da Zero Gravity Thinking. Consultora e mentora em estratégia, inovação e transformação organizacional.

Artigos relacionados

Todo ano é de aprendizado, mas 2025 foi ainda mais

Crédito caro, políticas públicas em transição, crise dos caminhões e riscos globais expuseram fragilidades e forçaram a indústria automotiva brasileira a rever expectativas, estratégias e modelos de negócio em 2025

ESG
30 de dezembro de 2025
No dia 31 de dezembro de 2025 acaba o prazo para adesão voluntária às normas IFRS S1 e S2. Se sua empresa ainda acha que tem tempo, cuidado: 2026 não vai esperar. ESG deixou de ser discurso - é regra do jogo, e quem não se mover agora ficará fora dele

Eliana Camejo - Conselheira de Administração pelo IBGC e Vice-presidente do Conselho de Administração da Sustentalli

3 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Aprendizado
30 de dezembro de 2025
Crédito caro, políticas públicas em transição, crise dos caminhões e riscos globais expuseram fragilidades e forçaram a indústria automotiva brasileira a rever expectativas, estratégias e modelos de negócio em 2025

Bruno de Oliveira - Jornalista e editor de negócios do site Automotive Business

3 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
29 de dezembro de 2025
Automação não é sobre substituir pessoas, mas sobre devolver tempo e propósito: eliminar tarefas repetitivas é a chave para engajamento, retenção e uma gestão mais estratégica.

Tiago Amor - CEO da Lecom

3 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
26 de dezembro de 2025
Reuniões não são sobre presença, mas sobre valor: preparo, escuta ativa e colaboração inteligente transformam encontros em espaços de decisão e reconhecimento profissional.

Jacque Resch - Sócia-diretora da RESCH RH

3 minutos min de leitura
Carreira
25 de dezembro de 2025
HSM Management faz cinco pedidos natalinos em nome dos gestores das empresas brasileiras, considerando o que é essencial e o que é tendência

Adriana Salles Gomes é cofundadora de HSM Management.

3 min de leitura
Liderança, Bem-estar & saúde
24 de dezembro de 2025
Se sua agenda lotada é motivo de orgulho, cuidado: ela pode ser sinal de falta de estratégia. Em 2026, os CEOs que ousarem desacelerar serão os únicos capazes de enxergar além do ruído.

Bruno Padredi - CEO da B2B Match

2 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Cultura organizacional
23 de dezembro de 2025
Marcela Zaidem, especialista em cultura nas empresas, aponta cinco dicas para empreendedores que querem reduzir turnover e garantir equipes mais qualificadas

Marcela Zaidem, Fundadora da Cultura na Prática

5 minutos min de leitura
Uncategorized, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
22 de dezembro de 2025
Inclusão não acontece com ações pontuais nem apenas com RH preparado. Sem letramento coletivo e combate ao capacitismo em todos os níveis, empresas seguem excluindo - mesmo acreditando que estão incluindo.

Carolina Ignarra - CEO da Talento Incluir

4 minutos min de leitura
Lifelong learning
19 de dezembro de 2025
Reaprender não é um luxo - é sobrevivência. Em um mundo que muda mais rápido do que nossas certezas, quem não reorganiza seus próprios circuitos mentais fica preso ao passado. A neurociência explica por que essa habilidade é a verdadeira vantagem competitiva do futuro.

Isabela Corrêa - Cofundadora da People Strat

8 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial, Inovação & estratégia
18 de dezembro de 2025
Como a presença invisível da IA traz ganhos enormes de eficiência, mas também um risco de confiarmos em sistemas que ainda cometem erros e "alucinações"?

Rodrigo Cerveira - CMO da Vórtx e Cofundador do Strategy Studio

3 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança