Estratégia, Marketing & growth
4 minutos min de leitura

A consolidação da Black Friday no calendário promocional brasileiro

De um caos no trânsito na Filadélfia à consolidação como código cultural no Brasil, a Black Friday evoluiu de liquidação para estratégia, transformando descontos em inteligência de precificação e redefinindo a relação entre consumo, margem e reputação
Gerente de Pricing e Inteligência de Mercado em uma multinacional do segmento de controle de acessos, com experiência consolidada em grandes empresas globais. É MBA em Marketing, certificado PMP e Certified Pricing Professional (CPP), além de fundador do grupo Attitude Pricing (Comunidade Brasileira de Profissionais de Pricing). Autor de artigos na Professional Pricing Society (PPS), já participou de debates internacionais como o podcast Impact Pricing, de Mark Stiving, e o Pricing Conectado 2024, promovido pela InfoPrice.

Compartilhar:

Dos congestionamentos da Filadélfia à cultura de consumo global

O termo “Black Friday” surgiu nos anos 1960, na Filadélfia, para descrever o caos no trânsito após o feriado de Ação de Graças. Com o tempo, o termo passou a designar o dia em que as lojas “saíam do vermelho” e “entravam no preto”, ou seja, voltavam a lucrar. Nos Estados Unidos, a Black Friday deixou de ser uma liquidação e tornou-se uma tradição cultural.

Em 2024, as vendas online superaram US$ 10,8 bilhões, segundo a Adobe Analytics. Hoje, o evento movimenta todo o ecossistema de consumo, do varejo físico aos marketplaces, passando por programas de fidelidade e até o setor automotivo.

O fenômeno que deixou de ser importado no Brasil

Há quinze anos, a Black Friday desembarcou no Brasil como uma curiosidade do varejo americano. O que começou com desconfiança e denúncias de “metade do dobro” virou um costume de consumo que movimenta bilhões e dita o ritmo de campanhas, estoques e margens.

Em 2024, o evento gerou R$ 9,4 bilhões em vendas, segundo o E-Commerce Brasil, e as projeções para 2025 ultrapassam R$ 13,6 bilhões.

A trajetória brasileira, porém, foi de aprendizado. Nos primeiros anos, o entusiasmo conviveu com preços maquiados, sites instáveis e atrasos. Em 2014, o termo “Black Fraude” viralizou e expôs a falta de maturidade comercial. Desde então, o país evoluiu: 89% dos consumidores conhecem a data, 82% pesquisam antes de comprar e 67% já realizaram compras. O brasileiro aprendeu a comparar, e os buscadores de histórico de preços viraram símbolos de cidadania econômica.

Hoje, o consumidor não é mais refém do desconto, é o auditor do preço.

Grandes varejistas criaram as chamadas Black Fridays de data cheia, 1/1, 2/2, 3/3, 4/4 ou 11/11 e 12/12, mini edições mensais que mantêm o engajamento e giram estoque. A Black Friday tornou-se um selo emocional de vantagem, um código cultural que reflete um país que incorporou a promoção à sua identidade de consumo.
Empresas brasileiras que tratam a Black Friday com o mesmo rigor estratégico aplicado às demais datas sazonais, usando técnicas de precificação e gestão de margem, já se consolidaram como líderes em receita e presença de marca nessa data emblemática, hoje parte definitiva do calendário promocional brasileiro.

Para avançar, as empresas precisam aplicar à Black Friday o mesmo rigor técnico e disciplina de margem usados na precificação de outras datas sazonais já consolidadas no calendário promocional.


Black Friday no contexto das indústrias: quando o desconto vira estratégia

As indústrias também precisam participar das dinâmicas promocionais da Black Friday e atuar em parceria com o varejo, especialmente por meio de planos conjuntos (Joint Business Plans – JBP).

Com uma abordagem simples e estruturada, é possível obter resultados sólidos:

• Mix promocional restrito, com itens de alto giro e margem previsível;
• Descontos sustentáveis, definidos por elasticidade e contribuição marginal;
• Duração controlada, evitando erosão de preço e canibalização de vendas futuras.

O resultado é maior penetração em canais estratégicos e fortalecimento de marca no segmento.

A principal lição é clara: a Black Friday não ameaça a rentabilidade, ela premia quem planeja.


Brasil x Estados Unidos: maturidade em escalas diferentes

Nos Estados Unidos, a Black Friday é um ecossistema maduro, com previsibilidade, controle de margem e estratégia omnichannel integrada. No Brasil, estamos em transição para esse estágio. Já há governança em grandes redes e visão de ciclo de vida de preço, mas ainda falta maturidade no médio varejo e na indústria.

Essa diferença, porém, é positiva, o Brasil vive um momento fértil, um ponto de virada entre improviso e inteligência. Estamos aprendendo que desconto não é remédio para o estoque, mas ferramenta de posicionamento, e que o preço, quando bem administrado, é uma das expressões mais sofisticadas da cultura corporativa.


Lições práticas para líderes e executivos decisores

1. Planeje o mix antes do desconto. Produtos de margem financiam produtos de atração.
2. Simule margens e elasticidades. Desconto exige base técnica, não euforia.
3. Defina tempo e propósito. Quanto mais longa a promoção, menor o valor percebido.
4. Monitore a recuperação pós-Black. Voltar ao preço cheio mantém credibilidade.
5. Use dados como defesa. O histórico de preço é o novo compliance.
6. Preserve reputação. O preço errado hoje custa mais do que uma venda perdida, custa confiança.


De volta para o futuro da Black Friday

A Black Friday brasileira amadureceu, e amadureceu rápido. Deixou de ser um experimento importado e se transformou em um laboratório de estratégia, onde transparência, inteligência e cultura de valor se encontram.
No fim, a data fala mais sobre o futuro da precificação do que sobre o passado. Quem aprende a precificar bem um único dia de desconto, aprende também a gerar valor em todos os outros dias do ano

Compartilhar:

Artigos relacionados

Imaginar como ato de reinvenção  

A pergunta “O que você vai ser quando crescer?” parece ingênua, mas carrega uma armadilha: a ilusão de que há um único futuro esperando por nós. Essa mesma armadilha ronda o setor automotivo. Afinal, que futuros essa indústria, uma das mais maduras do mundo, está disposta a imaginar para si?

Liderança
29 de setembro de 2025
No topo da liderança, o maior desafio pode ser a solidão - e a resposta está na força do aprendizado entre pares.

Rubens Pimentel - CEO da Trajeto Desenvolvimento Empresarial

4 minutos min de leitura
ESG, Empreendedorismo
29 de setembro de 2025
No Dia Internacional de Conscientização sobre Perdas e Desperdício de Alimentos, conheça negócios de impacto que estão transformando excedentes em soluções reais - gerando valor econômico, social e ambiental.

Priscila Socoloski CEO da Connecting Food e Lucas Infante, CEO da Food To Save

2 minutos min de leitura
Cultura organizacional
25 de setembro de 2025
Transformar uma organização exige mais do que mudar processos - é preciso decifrar os símbolos, narrativas e relações que sustentam sua cultura.

Manoel Pimentel

10 minutos min de leitura
Uncategorized
25 de setembro de 2025
Feedback não é um discurso final - é uma construção contínua que exige escuta, contexto e vínculo para gerar evolução real.

Jacqueline Resch e Vivian Cristina Rio Stella

4 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
24 de setembro de 2025
A IA na educação já é realidade - e seu verdadeiro valor surge quando é usada com intencionalidade para transformar práticas pedagógicas e ampliar o potencial de aprendizagem.

Rafael Ferreira Mello - Pesquisador Sênior no CESAR

5 minutos min de leitura
Inovação
23 de setembro de 2025
Em um mercado onde donos centralizam decisões de P&D sem métricas críveis e diretores ignoram o design como ferramenta estratégica, Leme revela o paradoxo que trava nosso potencial: executivos querem inovar, mas faltam-lhes os frameworks mínimos para transformar criatividade em riqueza. Sua fala é um alerta para quem acredita que prêmios de design são conquistas isoladas – na verdade, eles são sintomas de ecossistemas maduros de inovação, nos quais o Brasil ainda patina.

Rodrigo Magnago

5 min de leitura
Inovação & estratégia, Liderança
22 de setembro de 2025
Engajar grandes líderes começa pela experiência: não é sobre o que sua marca oferece, mas sobre como ela faz cada cliente se sentir - com propósito, valor e conexão real.

Bruno Padredi - CEP da B2B Match

3 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Liderança
19 de setembro de 2025
Descubra como uma gestão menos hierárquica e mais humanizada pode transformar a cultura organizacional.

Cristiano Zanetta - Empresário, palestrante TED e filantropo

0 min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial, Inovação & estratégia
19 de setembro de 2025
Sem engajamento real, a IA vira promessa não cumprida. A adoção eficaz começa quando as pessoas entendem, usam e confiam na tecnologia.

Leandro Mattos - Expert em neurociência da Singularity Brazil

3 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
17 de setembro de 2025
Ignorar o talento sênior não é só um erro cultural - é uma falha estratégica que pode custar caro em inovação, reputação e resultados.

João Roncati - Diretor da People + Strategy

3 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança