Liderança

Ambidestria: criando tensões paradoxais nas organizações

Garantir a continuidade do negócio e, ao mesmo tempo, um olhar nos horizontes de inovação é uma nova habilidade que deve ser desenvolvida no nível do indivíduo
Cofundadora da Ambidestra. Consultora e mentora em estratégia, inovação e transformação organizacional.

Compartilhar:

Se por um lado as startups têm como principais características a persistência frente às incertezas do mercado, a experimentação na criação de produtos e soluções, mudanças constantes até encontrarem um modelo de negócios repetível, escalável e sustentável, por outro as grandes empresas, mais tradicionais e maduras, possuem estruturas estáveis, com processos e controles mais estabelecidos, com o objetivo de entregar eficiência e rentabilidade, garantindo a manutenção do negócio.

O ponto em comum que temos observado em nossa experiência trabalhando com os dois perfis de organizações é o dilema da necessidade de se ter, dentro da mesma empresa, elementos distintos de ambos modelos: ao mesmo tempo em que o mundo VUCA (volátil, incerto, complexo e ambíguo) exige a flexibilidade de uma startup, é preciso ter um modelo de gestão estruturado que garanta as entregas do dia a dia e escalabilidade da gestão.

Então, a pergunta-chave é: como integrar e gerar sinergias para desenvolver este dinamismo, também chamado de ambidestria organizacional?

Temos aqui quatro temas importantes para que esta questão seja melhor compreendida.

## 1. Cultura

Tudo começa pelos valores organizacionais. Se queremos promover a inovação não podemos valorizar e reconhecer somente a eficiência operacional. Como são os seus valores? Quais comportamentos são direcionados a partir da sua cultura organizacional? Esse é o primeiro passo para alinhar os times sobre o caminho que a organização vai querer seguir.

Vale neste ponto revisar como operam seus modelos de reconhecimento, de promoção, de retenção de talentos. Avalie se os critérios premiam somente uma das competências ou se as duas estão sendo colocadas de forma equilibrada.

## 2. Estrutura e processos

É preciso promover um modelo de gestão que permita transitar entre os dois mundos a qualquer instante. Algumas organizações separam o time de inovação do time de operação do dia a dia, para um não tirar o foco do outro, mas entendemos que as duas competências devem andar cada vez mais juntas.

A chave da transformação está em ampliar o nosso olhar para além das nossas atividades, passando a compreender também as missões que temos para trazer mais valor cliente. Esta simples mudança de perspectiva traz uma oportunidade enorme para os times evoluírem com o que existe hoje ou inovarem, pegando novos caminhos.

Neste contexto, as metodologias ágeis, que permitem estruturar times flexíveis e multidisciplinares conforme os desafios de negócio, podem ser uma boa alternativa.

Com times auto-organizados, motivados e empoderados para entregar o que é preciso para melhorar a experiência do cliente, é possível reduzir burocracias, hierarquia e todos os processos que nos travam no dia a dia. Ou seja, não existem silos, e sim complementaridade de experiências de pessoas operando juntas com objetivos integrados. Com isso, começamos a solidificar uma cultura mais adaptável às mudanças e aberta à inovação.

## 3. Governança e liderança

Também é necessário estabelecer um sistema de governança, uma vez que obviamente haverá competição por recursos, com frequência escassos, gerando conflitos e ameaças à viabilidade e execução das inovações.

A clareza de propósito e senso de direção, com um processo de decisão bem estabelecido, ajudam a garantir que a priorização dos investimentos seja feita com critérios bem definidos, equilibrando a sustentação do negócio e exploração de rotas futuras para a inovação.

A liderança tem um papel fundamental, sendo o exemplo de comportamento que a organização quer ver replicado pelos times. Portanto, prepare os líderes para que inspirem e apoiem os times nesse momento de transformação.

## 4. Mindset de aprendizagem

O que temos visto em muitas organizações é que, apesar do foco em mudanças de estrutura, evolução de métodos e processos e até alinhamento de cultura, pouco se olha para o desenvolvimento do indivíduo orquestrando hard (competências técnicas) e soft skills (competências comportamentais).

A ambidestria vem da habilidade de equilibrar o olhar prático com o olhar intuitivo, do foco em resultado e do foco no cliente. Ou seja, vem do equilíbrio de habilidades e competências que cada um deve desenvolver a partir de um processo de autoconhecimento e autodesenvolvimento.

Para que isso seja possível, as organizações devem se abrir para um modelo de aprendizagem contínua, sendo uma espécie de “incubadora” para o desenvolvimento contínuo dos seus colaboradores.

Na biologia, as incubadoras são recintos com temperatura controlada, utilizada para o cultivo de microrganismos e para facilitar determinados testes biológicos.

Portanto, o incentivo à cultura de testes, a partir da abertura para formas alternativas de realizar tarefas ou resolver problemas, autonomia de pensamento e tolerância ao erro, é o ponto de partida. Deve-se também dar espaço para a improvisação.

Esforço, foco, planejamento, autoconhecimento e muita vontade são elementos fundamentais para quem deseja se tornar um profissional ambidestro. E quem despertar antes para essa necessidade, certamente será disputado no mercado por empresas de todos os portes e segmentos.

*Este artigo foi escrito com a Andrea Dietrich, minha parceira co-idealizadora do canal e podcast Ambidestra, de forma totalmente virtual, utilizando ferramentas de colaboração.*

Compartilhar:

Cofundadora da Ambidestra. Consultora e mentora em estratégia, inovação e transformação organizacional.

Artigos relacionados

A aposta calculada que levou o Boticário a ser premiado no iF Awards

Enquanto concorrentes correm para lançar coleções sazonais inspiradas em tendências efêmeras, o Boticário demonstra que compreende um princípio fundamental: o verdadeiro valor do design não está na estética superficial, mas em sua capacidade de gerar impacto social e econômico simultaneamente. A linha Make B., vencedora do iF Design Award 2025, não é um produto de beleza – é um manifesto estratégico.

Inovação
25 de agosto de 2025
A importância de entender como o design estratégico, apoiado por políticas públicas e gestão moderna, impulsiona o valor real das empresas e a competitividade de nações como China e Brasil.

Rodrigo Magnago

9 min de leitura
Cultura organizacional, ESG, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
25 de agosto de 2025
Assédio é sintoma. Cultura é causa. Como ambientes de trabalho ainda normalizam comportamentos abusivos - e por que RHs, líderes e áreas jurídicas precisam deixar a neutralidade de lado e assumir o papel de agentes de transformação. Respeito não pode ser negociável!

Viviane Gago, Facilitadora em desenvolvimento humano

5 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Estratégia, Inovação & estratégia, Tecnologia e inovação
22 de agosto de 2025
Em tempos de alta complexidade, líderes precisam de mais do que planos lineares - precisam de mapas adaptativos. Conheça o framework AIMS, ferramenta prática para navegar ambientes incertos e promover mudanças sustentáveis sem sufocar a emergência dos sistemas humanos.

Manoel Pimentel - Chief Scientific Officer na The Cynefin Co. Brazil

8 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Finanças, Marketing & growth
21 de agosto de 2025
Em tempos de tarifas, volta de impostos e tensão global, marcas que traduzem o cenário com clareza e reforçam sua presença local saem na frente na disputa pela confiança do consumidor.

Carolina Fernandes, CEO do hub Cubo Comunicação e host do podcast A Tecla SAP do Marketês

4 minutos min de leitura
Uncategorized, Empreendedorismo, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
20 de agosto de 2025
A Geração Z está redefinindo o que significa trabalhar e empreender. Por isso é importante refletir sobre como propósito, impacto social e autonomia estão moldando novas trajetórias profissionais - e por que entender esse movimento é essencial para quem quer acompanhar o futuro do trabalho.

Ana Fontes

4 minutos min de leitura
Inteligência artificial e gestão, Transformação Digital, Cultura organizacional, Inovação & estratégia
18 de agosto de 2025
O futuro chegou - e está sendo conversado. Como a conversa, uma das tecnologias mais antigas da humanidade, está se reinventando como interface inteligente, inclusiva e estratégica. Enquanto algumas marcas ainda decidem se vão aderir, os consumidores já estão falando. Literalmente.

Bruno Pedra, Gerente de estratégia de marca na Blip

3 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Estratégia, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
15 de agosto de 2025
Relatórios de tendências ajudam, mas não explicam tudo. Por exemplo, quando o assunto é comportamento jovem, não dá pra confiar só em categorias genéricas - como “Geração Z”. Por isso, vale refletir sobre como o fetiche geracional pode distorcer decisões estratégicas - e por que entender contextos reais é o que realmente gera valor.

Carol Zatorre, sócia e CO-CEO da Kyvo. Antropóloga e coordenadora regional do Epic Latin America

4 minutos min de leitura
Liderança, Bem-estar & saúde, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
14 de agosto de 2025
Como a prática da meditação transformou minha forma de viver e liderar

Por José Augusto Moura, CEO da brsa

5 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
14 de agosto de 2025
Ainda estamos contratando pessoas com deficiência da mesma forma que há décadas - e isso precisa mudar. Inclusão começa no processo seletivo, e ignorar essa etapa é excluir talentos. Ações afirmativas e comunicação acessível podem transformar sua empresa em um espaço realmente inclusivo.

Por Carolina Ignarra, CEO da Talento Incluir e Larissa Alves, Coordenadora de Empregabilidade da Talento Incluir

5 minutos min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas, Estratégia
13 de agosto de 2025
Lideranças que ainda tratam o tema como secundário estão perdendo talentos, produtividade e reputação.

Tatiana Pimenta, CEO da Vittude

2 minutos min de leitura