Uncategorized

Como a GoPro quer VIRAR UMA APPLE

Depois de criar um nicho de mercado e viver o auge do negócio, a GoPro precisa se reinventar para retomar o sucesso. Será possível?

Compartilhar:

Nick Woodman, fundador e CEO da GoPro, está em Vail, no Colorado, para o GoPro Mountain Games, festival de uma semana que promove eventos de caiaque, rafting, escalada e praticamente qualquer esporte que se pode praticar usando uma câmera de ação (action camera) acoplada. Ex-jogador de futebol americano no colégio e surfista inveterado, ele tem a autoconfiança típica de um empreendedor que começou seu negócio do zero até transformá-lo em um monstro de bilhões de dólares antes dos 40 anos. 

O GoPro Games é como uma volta olímpica anual para Woodman – uma lembrança de que, não importa quantos baques as ações de sua empresa enfrentem, a marca ainda é forte. Quando lançou o primeiro modelo da GoPro no início dos anos 2000, ele não criou apenas um dispositivo diferente, mas todo um novo mercado: o das câmeras de ação. A empresa cresceu rápido, tornou-se onipresente em seu nicho de mercado, sofreu forte revés em 2015 e agora reage com nova estratégia, que vale a pena acompanhar. 

**ASCENSÃO E QUEDA**

O primeiro empreendimento de Woodman foi a FunBug, empresa de games online que oferecia aos usuários a chance de ganhar prêmios semanalmente. Fracassou, culpou a si mesmo e se deu um prazo para conseguir montar um negócio de sucesso: até os 30 anos de idade. Quando não achou uma câmera à prova d’água durável, decidiu construir seu dispositivo. De modo artesanal, trabalhando de 18 a 20 horas por dia, criou um protótipo rudimentar. Pegou US$ 20 mil que sobraram da FunBug mais um empréstimo de US$ 200 mil dos pais e negociou com a chinesa Hotax para produzir cada câmera por US$ 3, que ele vendia em lojas de surfe por US$ 14. Nascia a GoPro Hero. 

Woodman, com cada melhoria e adaptação, demonstrou uma habilidade incrível para o design de produto, rapidamente transformando a GoPro no player dominante no que se tornou um mercado de US$ 6 bilhões, vendendo mais de 5 milhões de câmeras por ano. 

Com o grande impulso de cerca de 140 atletas patrocinados, os vídeos feitos com a GoPro acumularam milhões de visualizações no YouTube. Em 2012, a companhia experimentava um crescimento anual de cerca de 100%. A oferta pública de ações, em 2014, foi um sucesso tremendo, com alta de 140% nos primeiros três meses. Investidores ávidos esperavam que a expertise com o novo hardware da GoPro pudesse render negócios ainda mais rentáveis em mídia, entretenimento e redes sociais. 

Porém a demanda por câmeras de ação começou a diminuir e os analistas passaram a questionar: se, nesse nicho, a GoPro já tinha as seis câmeras mais vendidas entre as dez mais populares, conseguiria crescer mais? Será que ela não havia saturado o mercado? As alternativas mais baratas de concorrentes como Sony, Garmin e Praktika não prevaleceriam? 

Quando, em julho de 2015, a empresa fez o desastroso lançamento da GoPro Hero4 Session por US$ 399, as críticas explodiram – tanto que a GoPro reduziu o preço para US$ 199. Mesmo assim, as vendas continuaram a cair – no primeiro trimestre de 2016, por exemplo, a queda foi de 50% em relação ao ano anterior. O esperado lançamento do drone da GoPro foi adiado e as ações da empresa despencaram. 

Quando Woodman chegou ao GoPro Mountain Games, em junho de 2016, as ações da empresa flertavam com o menor preço histórico, tendo recuado mais de 90% em comparação com seu auge – um tombo capaz de fazer mesmo o maior entusiasta de esportes extremos sentir vertigem. 

![](https://revista-hsm-public.s3.amazonaws.com/uploads/3926d856-d5a3-4f84-be2c-eb9e252a5326.jpeg)

O surfista Nick Woodman (à direita) começou a vislumbrar o que seria a GoPro em uma viagem de surfe para a Indonésia em 2002; queria fazer fotos da perspectiva da prancha. Câmeras em celulares eram exceção e ninguém ousava enfiar câmera de vídeo na água

**REAÇÃO À LA APPLE**

O plano de retomada de crescimento de Woodman engloba um trio de novos produtos lançados no segundo semestre do ano passado: o drone batizado de Karma, a nova Hero e um software que torna a edição de vídeo e o compartilhamento mais fáceis. 

“Vamos fazer com que a GoPro seja a lente destacável de seu celular, incluindo o autoupload do conteúdo para a nuvem. Isso facilitará imensamente as coisas.” 

Woodman enxerga sua companhia como uma espécie de Apple em miniatura: uma empresa de hardware que evolui para uma plataforma de software com interface com redes sociais. Muitos, no entanto, a comparam com o Flip, serviço de vídeo digital lançado em 2007, mas que em 2011 estava obsoleto, por causa de smart phones com melhores funções de vídeo e lentes mais duráveis e resistentes à água – tanto o Galaxy S7 como o iPhone 7. 

Woodman discorda dessa visão: melhores smartphones atuam em favor da GoPro, em sua opinião. “Você não vai querer pôr em risco toda a informação que seu celular carrega e preferirá usar a GoPro. Faz toda a diferença”, acredita. 

A Hero5 é realmente um avanço, com um processador mais rápido e com melhorias na estabilidade, na durabilidade e na qualidade de som. 

O novo pacote de software, chamado internamente de “Yellowstone”, pode mesmo representar uma virada. Até os usuários mais aficionados sempre reclamaram que mover um vídeo da câmera para o computador ou celular, editá-lo e compartilhá-lo em uma rede social é um processo difícil e demorado. 

Woodman concorda que era assim e assume a responsabilidade pela lentidão com que a GoPro respondeu a essas limitações. “Eu subestimei o tamanho da equipe e a experiência necessária na liderança para desenvolvermos o software de que precisávamos”, diz. “Um software requer habilidades e abordagens muito diferentes das de um hardware.”

![](https://revista-hsm-public.s3.amazonaws.com/uploads/6396ea96-7397-4c36-869b-57dad2e1bd91.jpeg)

Em 2016, a GoPro adquiriu duas empresas de edição de vídeos em plataforma mobile, a Replay (que se transformou na Quik) e a Splice, por um valor total de US$ 105 milhões, integrando-as em uma proposta mais ampla. E o novo pacote de software resultante mostrou que é capaz de oferecer uma gama de opções de edição, visualização e compartilhamento de vídeos de modo mais rápido e fácil do que nunca. 

“O jeito mais simples de entendermos onde estamos e aonde queremos chegar é dizendo que a GoPro alcançou um sucesso no modelo do iPod, mas sem um iTunes. Imagine se a Apple não tivesse lançado o iTunes? O iPod seria só mais um MP3 player. A Apple conseguiu oferecer uma forma tranquila de as pessoas consumirem e administrarem uma quantidade enorme de conteúdo”, analisa Woodman. A GoPro estaria fazendo isso com o Yellowstone, mas, ao contrário do iTunes, cujo acesso é gratuito, virá com preço: US$ 5 por mês. 

O drone Karma também deixa a empresa esperançosa, pela possibilidade de alcançar novos usuários. O mercado de drones, de acordo com vários analistas, tem no mínimo o potencial de ser tão grande quanto o de câmeras de ação e cresce mais rápido, embora já seja dominado por um grande player, a empresa chinesa DJI. 

“Se o drone da GoPro for bem-sucedido, será um caminho rápido para dobrar o tamanho da empresa”, observa Charles Anderson, analista da Dougherty & Co. 

Woodman acha que a GoPro fez o produto perfeito. O pacote inclui um drone de quatro hélices, uma câmera Hero5, um controle remoto e um tripé destacável, o que faz do Karma a solução ideal para a captação de imagens, na terra e no ar. Ele deve sair de sua caixa para alçar voo em 2 minutos. 

“É como se tivéssemos colocado Hollywood em uma mochila”, diz Woodman. Além disso, um problema crônico das imagens feitas por drones sempre foi a visibilidade de quinas, cantos e áreas de difícil alcance, e talvez a câmera do Karma resolva isso. 

Agora, a batalha dos drones será dura: o Karma é mais lento que o Phantom 4, da DJI, não é dobrável como o Magic, também da DJI, e não tem outras ferramentas importantes e o alcance dos concorrentes. Seu pacote é o maior apelo: em vez de gastarem US$ 400 em uma Hero4, os usuários vão desembolsar cerca de US$ 1.000 por tudo, e o preço sugerido do Phantom 4, por exemplo, é de US$ 1.400. 

Além disso, a GoPro tem mais cartas na manga, como uma câmera de realidade virtual e o Omni (feito de seis Hero4 que podem filmar em 360 graus). Por sua vez, Woodman está aprendendo a delegar mais e parece mais atento aos prazos de lançamento, outra vulnerabilidade da empresa. 

Agora, para fazer tudo isso, a GoPro anda investindo mais pesado do que nunca e se via, no fim de 2016, com a menor quantidade de dinheiro em caixa desde que abriu o capital. 

**UM ECOSSISTEMA?**

Talvez Woodman consiga de fato criar sua “mini-Apple”, expandindo seu core business para um ecossistema de serviços digitais, entrando firme no negócio de drones e atraindo clientes de fora da comunidade dos esportes de ação. Mas não precisa.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Reputação sólida, ética líquida: o desafio da integridade no mundo corporativo

No mundo corporativo, reputação se constrói com narrativas, mas se sustenta com integridade real – e é justamente aí que muitas empresas tropeçam. É o momento de encarar os dilemas éticos que atravessam culturas organizacionais, revelando os riscos de valores líquidos e o custo invisível da incoerência entre discurso e prática.

Vivemos a reinvenção do CEO?

Está na hora de entender como o papel de CEO deixou de ser sinônimo de comando isolado para se tornar o epicentro de uma liderança adaptativa, colaborativa e guiada por propósito. A era do “chefão” dá lugar ao maestro estratégico que rege talentos diversos em um cenário de mudanças constantes.

Inovação
Enquanto você lê mais um relatório de tendências, seus concorrentes estão errando rápido, abolindo burocracias e contratando por habilidades. Não é só questão de currículos. Essa é a nova guerra pela inovação.

Alexandre Waclawovsky

8 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A aplicação da inteligência artificial e um novo posicionamento da liderança tornam-se primordiais para uma gestão lean de portfólio

Renata Moreno

4 min de leitura
Finanças
Taxas de juros altas, inovação subfinanciada: o mapa para captar recursos em melhorias que já fazem parte do seu DNA operacional, mas nunca foram formalizadas como inovação.

Eline Casasola

5 min de leitura
Empreendedorismo
Contratar um Chief of Staff pode ser a solução que sua empresa precisa para ganhar agilidade e melhorar a governança

Carolina Santos Laboissiere

7 min de leitura
ESG
Quando 84% dos profissionais com deficiência relatam saúde mental afetada no trabalho, a nova NR-1 chega para transformar obrigação legal em oportunidade estratégica. Inclusão real nunca foi tão urgente

Carolina Ignarra

4 min de leitura
ESG
Brasil é o 2º no ranking mundial de burnout e 472 mil licenças em 2024 revelam a epidemia silenciosa que também atinge gestores.
5 min de leitura
Inovação
7 anos depois da reforma trabalhista, empresas ainda não entenderam: flexibilidade legal não basta quando a gestão continua presa ao relógio do século XIX. O resultado? Quiet quitting, burnout e talentos 45+ migrando para o modelo Talent as a Service

Juliana Ramalho

4 min de leitura
ESG
Brasil é o 4º país com mais crises de saúde mental no mundo e 500 mil afastamentos em 2023. As empresas que ignoram esse tsunami pagarão o preço em produtividade e talentos.

Nayara Teixeira

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Empresas que integram IA preditiva e machine learning ao SAP reduzem custos operacionais em até 30% e antecipam crises em 80% dos casos.

Marcelo Korn

7 min de leitura
Empreendedorismo
Reinventar empresas, repensar sucesso. A megamorfose não é mais uma escolha e sim a única saída.

Alain S. Levi

4 min de leitura