Diversidade

Como avançar em diversidade e inclusão nas organizações

A sociedade e as empresas devem investir em espaços acolhedores e de diálogo
É sócia-diretora da RESCH RH, empresa especializada na captação de talentos e desenvolvimento humano e organizacional, que trabalha com a abordagem COMversas, cujo objetivo é promover o diálogo e acessar a inteligência coletiva nas organizações. Jacqueline atua há mais de 40 anos como consultora, coach, facilitadora de diálogos, professora e palestrante.Co autora dos livros “Colaboração e Diálogo: aportes teóricos e possibilidades práticas” (CRV, 2018) e Marcas, Memória e Representação (ESPM-Rio/ Topbooks, 2017). Foi professora no MBA de RH da PUC durante 15 anos.

Compartilhar:

Abraçar a diversidade nas empresas é um processo que requer intenção, mas que vai muito além disso. Precisa ser construído por muitas mãos e requer uma postura de aprendizagem da parte de todos.

Vernã Myers, vice-presidente de estratégia de inclusão na Netflix, disse: “Diversidade é convidar para a festa, inclusão é chamar para dançar”, mas a frase em si incomoda porque revela ainda uma assimetria. Pense comigo: se apenas um grupo de pessoas escolhe a música, o local, os convidados, a dança e os respectivos pares, a inclusão pode ficar um pouco de fora da festa. Seguindo essa analogia, a realidade na maioria das empresas é que os grupos dominantes têm a prerrogativa de chamar para a dança enquanto aos demais caberia aguardar um convite para o bailado.

Na dança, assim como na cultura de uma organização, a harmonia é crucial. É necessário observar o nosso ritmo e o do outro ao movimentar o corpo, para alcançar o entrosamento que torna a dança coordenada e prazerosa. Ainda que, em teoria, isso possa ser divertido, na prática, não escapamos todos de uns bons encontrões e pisões até acertar. O motivo disso é que nem todos possuem o mesmo ritmo e tiveram as mesmas experiências para usar os mesmos passos.

## Olhar para si e olhar para o outro
Uma característica presente nos(as) melhores bailarino(as) é a consciência que se tem do próprio corpo. Na vida profissional também é assim. O autoconhecimento é necessário e é produto de uma análise profunda de si. Entretanto, a dança em uma organização e na sociedade, como já falamos, não é um solo.

Ninguém é uma tela em branco. Somos frutos de milhares de experiências que vão construindo nossa identidade. As marcas deixadas pelas vivências diárias determinam o jeito de ver o mundo, a interpretação da realidade e, portanto, as escolhas e atitudes.

Chimamanda Ngozi Adichie, premiada escritora nigeriana, explica como vamos formando uma visão de mundo limitada que não dá conta da multiplicidade de narrativas. Em seu texto “O perigo de uma história única”, provoca o leitor.

“Nós tínhamos, como era normal, empregada doméstica, que frequentemente vinha das aldeias rurais próximas. Quando eu fiz oito anos, arranjamos um novo menino para a casa. Seu nome era Fide. A única coisa que minha mãe nos disse sobre ele foi que sua família era muito pobre. /[…/] eu sentia uma enorme pena da família de Fide. Então, num sábado, nós fomos visitar a sua aldeia e sua mãe nos mostrou um cesto com um padrão lindo, feito de ráfia seca por seu irmão. Eu fiquei atônita! /[…/] havia se tornado impossível, pra mim, vê-los como alguma coisa além de ‘pobres’. Sua pobreza era minha única história sobre eles.” (trecho de “O perigo de uma história única”, de Chimamanda Ngozi Adichie)

Chimamanda reconhece com perplexidade como estava formando uma visão única sobre a família de Fide. Muitas vezes incorremos nestas generalizações, sem nos darmos conta e passamos a interpretar o presente com base no que aprendemos e vivemos, ainda que esta interpretação possa contrariar a lógica do que está acontecendo no contexto atual. Isso acontece porque agimos e nos posicionamos com base em conceitos internalizados, passamos a fazer associações automáticas. Ou seja, nosso jeito de ver as coisas tem um viés, mecanismo que é chamado de viés inconsciente, viés cognitivo ou ainda preconceito implícito.

É com bagagens repletas de experiências prévias que chegamos à festa.

## Como acertar o passo?
Algumas organizações que adotaram o ESG (ambiental, social e governança, em português) como pilar de gestão, com políticas e práticas para favorecer a diversidade e inclusão, oferecem aos seus colaboradores treinamento em viés inconsciente. Esta é uma prática que deve ser aplaudida, mas não impede que se erre, já que as crenças estão arraigadas. E como não foram construídas num estalar de dedos, a desconstrução também não será rápida. O processo é difícil, contínuo e trabalhoso.

Estamos todos em modus aprendizado!

Uma forma de aprender é colocar nossas convicções em cheque. O preconceito é algo que, em algum momento, aprendemos e assimilamos. É na decisão de furar nossas bolhas, de conviver com pessoas, grupos e ideias diversas que reside a possibilidade de abertura. Uma busca nada fácil, já que o diálogo pressupõe lidar com a tensão das diferenças.

Portanto, se você quer aprender a apreciar a multiplicidade, é preciso preparar-se para o estranhamento e para os incômodos, afinal é um mundo novo que se apresenta e perspectivas que contrariam a nossa maneira habitual de ver a realidade.

Dê uma folga ao julgamento. Sim, todos nós julgamos. Com isso, estou sugerindo apenas dar um tempo. Convoque sua curiosidade e respeito, como se estivesse se preparando para uma viagem a um país com hábitos e costumes bem diferentes dos seus. Deixe que a curiosidade seja sua aliada e seu guia.

Por que será que ele pensa e vive assim? Como chegou nesta ideia? Que vivências levaram a estas formulações? Porque me causa tanto estranhamento a sua forma de pensar e viver?

Veja bem, não há respostas exatas, mas esta aproximação pode ajudar a entender melhor os diferentes pontos de vista, legitimando a história de cada um e fornecendo recursos para construir relações mais dialógicas.

Na busca genuína para transformar a realidade e garantir diversidade nas organizações, dançamos ainda aos tropeços. Deslizes acontecem e, sem nem perceber, lá estamos nós empregando expressões ou reproduzindo atitudes que denunciam nossos preconceitos. Não somos preconceituosos porque somos pessoas ruins, mas porque aprendemos a compreender o mundo de determinada maneira. Nossos preconceitos são, na realidade, nossas pré-compreensões.

## Responsabilidade relacional
Na busca de acertar o passo, aqueles que erram devem reconhecer, se desculpar e manifestar desejo genuíno de aprender e reparar. Os que são injustiçados com estes equívocos têm o papel de denunciar, mas também esclarecer e educar. Quando a denúncia se faz pela agressão e quem erra se sente atacado, a distância tende a se estabelecer e os pontos de vista a se polarizar. E, infelizmente, muitas vezes essa ainda é a resposta àqueles que erram o passo.

Sheila McNamee, Ph.D e professora emérita de Comunicação da Universidade de New Hampshire, diz que é preciso mover-se de uma perspectiva individual para uma noção de responsabilidade relacional. “Não é você, não sou eu, é o que estamos fazendo juntos. Nós juntos somos responsáveis pelo que estamos criando”, diz ela, e chama isso de responsabilidade relacional.

É crucial que a sociedade e as organizações insistam e invistam na criação de espaços de diálogo, espaços estes que devem existir nas empresas para que se possa conversar abertamente sobre as situações conflitivas dentro e fora delas. Somente assim podemos construir com o outro práticas que valorizem a diversidade na organização e na sociedade.

Trabalhemos todos para ter festas abertas para quem quiser chegar!

Compartilhar:

Artigos relacionados

Os sete desafios das equipes inclusivas

Inclusão não acontece com ações pontuais nem apenas com RH preparado. Sem letramento coletivo e combate ao capacitismo em todos os níveis, empresas seguem excluindo – mesmo acreditando que estão incluindo.

Reaprender virou a palavra da vez

Reaprender não é um luxo – é sobrevivência. Em um mundo que muda mais rápido do que nossas certezas, quem não reorganiza seus próprios circuitos mentais fica preso ao passado. A neurociência explica por que essa habilidade é a verdadeira vantagem competitiva do futuro.

Tecnologia & inteligencia artificial
2025
O PIX ABRIU PORTAS QUE ABRIRÃO MAIS PORTAS!

Carlos Netto, fundador e CEO da Matera

0 min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
2025

João Carlos da Silva Bizario e Gulherme Collin Soárez, respectivamente CMAO e CEO da Inspirali Educação.

0 min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial, Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
5 de setembro de 2025
O maior desafio profissional hoje não é a tecnologia - é o tempo. Descubra como processos claros, IA consciente e disciplina podem transformar sobrecarga em produtividade real.

Diego Nogare

6 minutos min de leitura
Marketing & growth, Cultura organizacional, Inovação & estratégia, Liderança
4 de setembro de 2025
Inspirar ou limitar? O benchmark pode ser útil - até o momento em que te afasta da sua singularidade. Descubra quando olhar para fora deixa de fazer sentido.

Bruna Lopes de Barros

3 minutos min de leitura
Inovação
3 de setembro de 2025
Em entrevista com Rodrigo Magnago, Fernando Gama nos conta como a Docol tem despontado unindo a cultura do design na organização

Rodrigo Magnago

4 min de leitura
ESG, Inovação & estratégia, Tecnologia & inteligencia artificial
3 de setembro de 2025
O plástico nasceu como símbolo do progresso - hoje, desafia o futuro do planeta. Entenda como uma invenção de 1907 moldou a sociedade moderna e se tornou um dos maiores dilemas ambientais da nossa era.

Anna Luísa Beserra - CEO da SDW

0 min de leitura
Inovação & estratégia, Empreendedorismo, Tecnologia & inteligencia artificial
2 de setembro de 2025
Como transformar ciência em inovação? O Brasil produz muito conhecimento, mas ainda engatinha na conversão em soluções de mercado. Deep techs podem ser a ponte - e o caminho já começou.

Eline Casasola - CEO da Atitude Inovação

5 minutos min de leitura
Liderança, Empreendedorismo, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Inovação & estratégia
1 de setembro de 2025
Imersão de mais de 10 horas em São Paulo oferece conteúdo de alto nível, mentorias com especialistas, oportunidades de networking qualificado e ferramentas práticas para aplicação imediata para mulheres, acelerando oportunidades para um novo paradigma econômico

Redação HSM Management

0 min de leitura
Inovação & estratégia, Marketing & growth
1 de setembro de 2025
Na era da creator economy, influência não é mais sobre alcance - é sobre confiança. Você já se deu conta como os influenciadores se tornaram ativos estratégicos no marketing contemporâneo? Eles conectam dados, propósito e performance. Em um cenário cada vez mais automatizado, é a autenticidade que converte.

Salomão Araújo - VP Comercial da Rakuten Advertising no Brasil

3 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Liderança
29 de agosto de 2025
Estamos entrando na temporada dos planos estratégicos - mas será que o que chamamos de “estratégia” não é só mais uma embalagem bonita para táticas antigas? Entenda o risco do "strategy washing" e por que repensar a forma como construímos estratégia é essencial para navegar futuros possíveis com mais consciência e adaptabilidade.

Lilian Cruz, Cofundadora da Ambidestra

4 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança