Estratégia e Execução

Como tornar comunidades rurais mais sustentáveis?

Essencial para o desenvolvimento econômico do Brasil, a agricultura familiar, presente em pequenas comunidades, precisa ser fortalecida. Neste sentido, listo quatro diretrizes para tornar esse modelo de cultivo antifrágil
Técnico Agrícola e administrador, especialista em cafeicultura sustentável, trabalhou na Prefeitura Municipal de Poços de Caldas (MG) e foi coordenador do Movimento Poços de Caldas Cidade de Comércio Justo e Solidário. Ulisses é consultor de associações e cooperativas e certificações agrícolas.

Compartilhar:

Falar sobre agronegócio no Brasil é também falar em agricultura familiar, afinal a produção feita por pequenos proprietários representa uma importante e crescente parcela do rendimento agropecuário em todo o país.

A agricultura familiar alimenta a população, movimenta o mercado local e a economia dos municípios. Em complemento, esse modelo colabora para a exportação, gera riqueza e ganha espaço em diversas cadeias produtivas.

Quem conhece meu trabalho sabe que sou um entusiasta da agricultura familiar e este entusiasmo vem de saber que é esse o meu lugar, meu propósito, onde posso contribuir de alguma forma. E, na minha vida profissional, tive o privilégio de fazer aquilo que gosto. Trabalhando em instituições públicas ou sem fins lucrativos, pude contribuir para o desenvolvimento de agricultores familiares em várias regiões do país.

Observei que esse é um dos principais desafios na maioria dos municípios brasileiros, um país no qual a maioria das localidades tem a produção agropecuária como a principal fonte econômica e de motor social. Assim, a agricultura familiar se faz forte e presente em todas as regiões.

## Comunidades antifrágeis

O desafio de promover o desenvolvimento da agricultura familiar recebeu grande atenção nos últimos 20 anos, tendo em vista o acesso mais amplo de milhares de famílias às políticas públicas em âmbito nacional e estadual. Alguns exemplos nesse sentido são os programas de crédito rural e assistência técnica de qualidade. No entanto, quando se dá um zoom nesse cenário, observa-se que algumas comunidades estão se fortalecendo, e outras não.

Como gestor público local, sempre tive como objetivo fortalecer a agricultura familiar nos municípios, mas recentemente lendo o livro “Cidades Antifrageis” de Caio Esteves – e fazendo um curso de verão denominado de gestão de PME’s e territórios da Università degli Studi di Padova, em parceria com o Instituto Italo-Latinoamericano (IILA) e a Universidad Técnica Nacional (UTN) de Costa Rica –, percebi que aquilo que ainda denomino de desenvolvimento rural sustentável é um conceito que precisa ser compartilhado.

Por isso, este artigo tem como propósito ser um instrumento para gestores públicos e de organismos não governamentais que buscam fortalecer a agricultura familiar em seus municípios. Assim, descrevo algumas sugestões de como transformar comunidades rurais.

### 1 – Fortalecer cooperativas

Primeiramente é importante entender o porquê de trabalharmos num nível local, na promoção do desenvolvimento de comunidades rurais sustentáveis, e não apenas no desenvolvimento individual de cada família agricultora. Com isso, cito frase da professora Patrizzia Messina que diz: “para que um empreendimento seja competitivo, é importante que a localidade como um todo esteja desenvolvida”.

Dada a natureza de pequena escala da produção familiar para conseguir recursos, mercado e se manter competitiva, é muito mais difícil se o(a) agricultor(a) trabalhar isolado. Assim, é fundamental que o pequeno agropecuário esteja inserido em algum grupo produtivo. Além disso, quando impulsionamos o desenvolvimento da comunidade como um todo, os indivíduos, em sua maioria, tendem a se desenvolver também.

### 2 – Mapeamento e liderança

Um segundo ponto é entender e conhecer a comunidade a qual se deseja promover o desenvolvimento rural sustentável. Nesse caso, o primeiro passo seria delimitar a localidade, seja geograficamente ou por objetivos comuns de produção. Em um segundo momento, é preciso mapear os pontos fortes e fracos da comunidade, registrando ameaças e oportunidades, além de conhecer sua história, crenças e valores.

Muito embora eu seja entusiasta das metodologias ágeis, nesse caso prefiro, ainda, aderir ao uso de metodologias tradicionais de diagnóstico comunitário. Esse modelo metodológico leva mais tempo para ser concretizado, mas, a meu ver, possibilita a criação de um diagnóstico da comunidade muito mais rico. Metodologias utilizadas por empresas de assistências técnicas e extensão rural, como o Mexpar, são ferramentas que contribuem para isso.

Outro ponto fundamental na fase de diagnóstico é descobrir, conhecer e até formar lideranças. Essa é uma questão de grande importância, pois identificar as lideranças locais ajuda no protagonismo de projetos.

Nesse processo, o ideal a busca por lideranças entre jovens, mulheres, trabalhadores, artesãos, empreendedores, produtores tradicionais. Em síntese todos os grupos devem ser identificados. Nesse conceito de liderança, o fundamental é identificar quem está disposto a servir à comunidade, e não dela se servir.

### 3 – Legitimar um pacto local

A terceira fase é da validação. Acredito ser possível utilizar metodologias ágeis de envolvimento participativo da comunidade, principalmente quando se apresenta o resultado do diagnóstico realizado com a comunidade e dados diversos que ajudem na sua caracterização.

Nessa fase, a comunidade como um todo é convidada a visualizar esse “mapeamento” e pensar o futuro, como desejam estar. Nessa etapa, o ideal é a criação de um pacto local onde todos tenham o entendimento dos objetivos e sejam convocados a alcançá-los em conjunto.

### 4 – Execução do projeto

A quarta fase começa a execução do projeto. Nessa etapa não há muito o que ser exemplificado. Em síntese, é preciso haver dedicação e coordenação. O sucesso dessa fase dependerá muito do comprometimento com o projeto.

Na maioria das vezes, como os desafios serão maiores que a capacidade da localidade de enfrentar seus obstáculos, a coordenação e suas lideranças devem sempre pensar na busca por parcerias com organizações não governamentais, órgãos públicos, empresas e universidades, como objetivo de alcançar conhecimento técnico, recursos, infraestrutura e articulação para que todas demandas possam ser atendidas. Nesse caso, o tamanho do sucesso é proporcionalmente igual número de parceiras que o projeto conseguir atrair.
Com tantas organizações procurando projetos comunitários para apoiar, se desenvolver de forma isolada representa um erro estratégico, e isso vale tanto para o agricultor, quanto para uma comunidade.

### Desenvolvimento sustentável

Embora possa parecer já muito conhecido, esse passo a passo é difícil de ser encontrado nas localidades. As pequenas comunidades agropecuárias estão muitas vezes preocupadas em apagar incêndios e resolver os problemas do dia a dia, e não se preocupam em pensar o seu futuro.

Por outro lado, os exemplos de comunidades que estão desenvolvendo planos integrados com o objetivo de promoção de comunidades rurais sustentáveis são extremamente animadores e mostram que o fortalecimento das comunidades é uma forma eficaz de apoio à agricultura familiar nos municípios.

## UM PAÍS DE REFERÊNCIAS

Por fim, para citar alguns exemplos, esse modelo proposto cria verdadeiros oceanos azuis: como o da canastra no interior de Minas Gerais, o vale do São Francisco na produção de uvas, o norte pioneiro do Paraná na valorização dos cafés e frutas, a produção orgânica no município de Poço Fundo e a de mel em Bocaiuva, ou a Cooperativa Central de Produção Orgânica da Transamazônica e Xingu em Altamira, no Pará.

Nessas localidades a atuação comunitária da agricultura familiar extrapolou as questões relacionadas ao agronegócio, impactando em toda a sociedade. Isso demonstra que investir na agricultura familiar é sempre um bom negócio.

*Gostou do artigo do Ulisses Ferreira de Oliveira? Saiba mais sobre agronegócio e gestão assinando gratuitamente [nossas newsletters](https://www.revistahsm.com.br/newsletter) e escutando [nossos podcastas](https://www.revistahsm.com.br/podcasts) na sua plataforma de streaming favorita.*

Compartilhar:

Artigos relacionados

Cultura organizacional, Estratégia, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
15 de agosto de 2025
Relatórios de tendências ajudam, mas não explicam tudo. Por exemplo, quando o assunto é comportamento jovem, não dá pra confiar só em categorias genéricas - como “Geração Z”. Por isso, vale refletir sobre como o fetiche geracional pode distorcer decisões estratégicas - e por que entender contextos reais é o que realmente gera valor.

Carol Zatorre, sócia e CO-CEO da Kyvo. Antropóloga e coordenadora regional do Epic Latin America

4 minutos min de leitura
Liderança, Bem-estar & saúde, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
14 de agosto de 2025
Como a prática da meditação transformou minha forma de viver e liderar

Por José Augusto Moura, CEO da brsa

5 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
14 de agosto de 2025
Ainda estamos contratando pessoas com deficiência da mesma forma que há décadas - e isso precisa mudar. Inclusão começa no processo seletivo, e ignorar essa etapa é excluir talentos. Ações afirmativas e comunicação acessível podem transformar sua empresa em um espaço realmente inclusivo.

Por Carolina Ignarra, CEO da Talento Incluir e Larissa Alves, Coordenadora de Empregabilidade da Talento Incluir

5 minutos min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas, Estratégia
13 de agosto de 2025
Lideranças que ainda tratam o tema como secundário estão perdendo talentos, produtividade e reputação.

Tatiana Pimenta, CEO da Vittude

2 minutos min de leitura
Gestão de Pessoas, Carreira, Desenvolvimento pessoal, Estratégia
12 de agosto de 2025
O novo desenho do trabalho para organizações que buscam sustentabilidade, agilidade e inclusão geracional

Cris Sabbag - Sócia, COO e Principal Research da Talento Sênior

5 minutos min de leitura
Liderança, Gestão de Pessoas, Lifelong learning
11 de agosto de 2025
Liderar hoje exige mais do que estratégia - exige repertório. É preciso parar e refletir sobre o novo papel das lideranças em um mundo diverso, veloz e hiperconectado. O que você tem feito para acompanhar essa transformação?

Bruno Padredi

3 minutos min de leitura
Diversidade, Estratégia, Gestão de Pessoas
8 de agosto de 2025
Já parou pra pensar se a diversidade na sua empresa é prática ou só discurso? Ser uma empresa plural é mais do que levantar a bandeira da representatividade - é estratégia para inovar, crescer e transformar.

Natalia Ubilla

5 minutos min de leitura
ESG, Cultura organizacional, Inovação
6 de agosto de 2025
Inovar exige enxergar além do óbvio - e é aí que a diversidade se torna protagonista. A B&Partners.co transformou esse conceito em estratégia, conectando inclusão, cultura organizacional e metas globais e impactou 17 empresas da network!

Dilma Campos, Gisele Rosa e Gustavo Alonso Pereira

9 minutos min de leitura
Cultura organizacional, ESG, Gestão de pessoas, Liderança, Marketing
5 de agosto de 2025
No mundo corporativo, reputação se constrói com narrativas, mas se sustenta com integridade real - e é justamente aí que muitas empresas tropeçam. É o momento de encarar os dilemas éticos que atravessam culturas organizacionais, revelando os riscos de valores líquidos e o custo invisível da incoerência entre discurso e prática.

Cristiano Zanetta

6 minutos min de leitura
Inteligência artificial e gestão, Estratégia e Execução, Transformação Digital, Gestão de pessoas
29 de julho de 2025
Adotar IA deixou de ser uma aposta e se tornou urgência competitiva - mas transformar intenção em prática exige bem mais do que ambição.

Vitor Maciel

3 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)