Uncategorized

Ruído, caos, energia e conflito

O talento máximo de um grupo em geral vem à tona em meio a uma nuvem de confusão criativa
É sócio da RIA, empresa especializada em construir segurança psicológica em equipes. Criador do PlayGrounded, a Ginástica do Humor, é jornalista (Folha de S.Paulo, Veja, Superinteressante e Vida Simples), foi sócio da consultoria Origami e consultor em branding. Ator e improvisador, integra o grupo Jogo da Cena.

Compartilhar:

Em dezembro de 2000, deixei a equipe da revista Veja para assumir um lugar de editor especial na revista Superinteressante. As duas redações ficavam separadas por alguns andares, no mesmo prédio da editora Abril, na marginal Pinheiros, em São Paulo. Mas parecia que ficavam em planetas diferentes.

A redação da Veja parecia uma sala de espera de hospital. Silenciosa, as pessoas cada uma em sua mesa, sentadas, olhando a tela do computador e falando em voz baixa. Todo dia, nos 9 meses em que fui repórter de política da revista, eu comparecia à redação vestindo terno e gravata, embora em 90% dos dias só quem me via era meu chefe e meus colegas.

Já na redação da Superinteressante, as discussões sobre as chamadas de capa eram eventos animados e barulhentos, em que todo mundo participava. Olhando em retrospectiva, percebo que estávamos o tempo todo discutindo a plenos pulmões os temas das reportagens, isso sem falar nas reuniões de avaliação de cada edição publicada, em que todo mundo se sentia à vontade para criticar as reportagens uns dos outros, apontando lacunas ou desvios de pensamento.

## Caos e resultado

Aquele time da Superinteressante foi uma das experiências mais marcantes para todos nós que trabalhamos lá. A revista era viva, criativa, excitante. A cada edição, desafiávamos o status quo, questionando tudo: a criminalização das drogas, o consumo de carne, o tabu de falar sobre suicídio e os mitos religiosos.

A Veja continuava sendo a maior revista do Brasil e tinha uma redação talentosíssima. Sua folha de pagamento tinha muito mais dígitos que a da Super. Mas vinha perdendo leitores, ano a ano. Já a Superinteressante, apesar da algazarra e do caos, era a publicação cuja receita mais crescia, ano a ano, no prédio todo. Ganhamos prêmios, lançamos novos títulos, criamos novos produtos, contratamos talentos. A Super era uma usina de criatividade, que extraía todo o talento de cada jornalista e cada designer.

No âmago daquela criatividade da Super, reinava o caos. Um caos criativo, confuso, vivo, exuberante. O caos que se espera de uma equipe de alta performance.

## Eficiência é viva

Não se engane: as equipes mais eficientes, as que aproveitam ao máximo seus talentos, não são aquelas em que todos obedecem ao chefe e parecem bonzinhos.
As equipes de alta performance são aquelas em que todos se sentem à vontade para opinar, para ajudar o time a alcançar os objetivos compartilhados, para dar sua contribuição. Nas equipes de alta performance, ninguém se omite.

E, quando ninguém se omite, há muita gente falando. Há muitas visões distintas sobre a mesa. Estamos todos vivos, interessados, atentos.

Não se mantém esse espírito, se as pessoas não se sentirem ouvidas. Nas equipes mais eficientes, as pessoas sentem que sua opinião conta, que cada um pode fazer a diferença. Todos falam e ouvem, contribuem sobre as ideias uns dos outros. Há disputa, sem dúvida. Há conflito de ideias e às vezes há confronto, somos humanos, afinal. Mas todos sabemos que, ao final, prevalecerá o que for melhor para o time.

## O pesadelo do chefe

Para alguns tipos de gestor, um cenário como o da Super é um pesadelo. São pessoas que galgaram espaço até a liderança porque operam bem em uma cultura na não é de bom tom desafiar a visão do líder. Forjado nesse ambiente, esse tipo de liderança ainda acha que deve saber todas as respostas e espera ser quem decide, sempre.

Um líder que ainda não aprendeu a conviver com a energia criativa plena de sua equipe quer evitar ao máximo o ambiente caótico da alta colaboração, em que sua opinião e seu modo de fazer podem ser desafiados a qualquer momento. Ele ou ela não quer ver as conversas e planos rumarem para territórios em que não tenha nada a contribuir ou mesmo pode se ver falando besteira. E se um conflito eclodir no time e eu não souber o que fazer?

Se essa pessoa não estiver consciente de que esse caos é o ambiente ideal para que o trabalho criativo floresça, é natural que tente se proteger.

Nascem então regras que, a pretexto de agilizar as reuniões, vão tolher a pluralidade. Surgem diretrizes padronizadas que não podem ser adaptadas à realidade local. Criam-se punições mais severas para o descumprimento de orientações. E todo resultado não esperado passa a ser tachado de erro.

Aos poucos, as conversas mais importantes voltam a ser feitas em voz baixa, longe dos ouvidos mais altos na hierarquia. A criatividade definha. Os resultados perdem o viço de antes. Não será de se espantar se os talentos começarem a olhar por cima do muro, em busca de algum lugar mais arejado para viver.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Os sete desafios das equipes inclusivas

Inclusão não acontece com ações pontuais nem apenas com RH preparado. Sem letramento coletivo e combate ao capacitismo em todos os níveis, empresas seguem excluindo – mesmo acreditando que estão incluindo.

Reaprender virou a palavra da vez

Reaprender não é um luxo – é sobrevivência. Em um mundo que muda mais rápido do que nossas certezas, quem não reorganiza seus próprios circuitos mentais fica preso ao passado. A neurociência explica por que essa habilidade é a verdadeira vantagem competitiva do futuro.

Inovação & estratégia, Marketing & growth
11 de dezembro de 2025
Do status à essência: o luxo silencioso redefine valor, trocando ostentação por experiências que unem sofisticação, calma e significado - uma nova inteligência para marcas em tempos pós-excesso.

Daniel Skowronsky - Cofundador e CEO da NIRIN Branding Company

3 minutos min de leitura
Estratégia
10 de dezembro de 2025
Da Coreia à Inglaterra, da China ao Brasil. Como políticas públicas de design moldam competitividade, inovação e identidade econômica.

Rodrigo Magnago - CEO da RMagnago

17 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde
9 de dezembro de 2025
Entre liderança e gestação, uma lição essencial: não existe performance sustentável sem energia. Pausar não é fraqueza, é gestão - e admitir limites pode ser o gesto mais poderoso para cuidar de pessoas e negócios.

Tatiana Pimenta - Fundadora e CEO da Vittude,

3 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde
8 de dezembro de 2025
Com custos de saúde corporativa em alta, a telemedicina surge como solução estratégica: reduz sinistralidade, amplia acesso e fortalece o bem-estar, transformando a gestão de benefícios em vantagem competitiva.

Loraine Burgard - Cofundadora da h.ai

3 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde, Liderança
5 de dezembro de 2025
Em um mundo exausto, emoção deixa de ser fragilidade e se torna vantagem competitiva: até 2027, lideranças que integram sensibilidade, análise e coragem serão as que sustentam confiança, inovação e resultados.

Lisia Prado - Consultora e sócia da House of Feelings

5 minutos min de leitura
Finanças
4 de dezembro de 2025

Antonio de Pádua Parente Filho - Diretor Jurídico, Compliance, Risco e Operações no Braza Bank S.A.

3 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Marketing & growth
3 de dezembro de 2025
A creators economy deixou de ser tendência para se tornar estratégia: autenticidade, constância e inovação são os pilares que conectam marcas, líderes e comunidades em um mercado digital cada vez mais colaborativo.

Gabriel Andrade - Aluno da Anhembi Morumbi e integrante do LAB Jornalismo e Fernanda Iarossi - Professora da Universidade Anhembi Morumbi e Mestre em Comunicação Midiática pela Unesp

3 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
2 de dezembro de 2025
Modelos generativos são eficazes apenas quando aplicados a demandas claramente estruturadas.

Diego Nogare - Executive Consultant in AI & ML

4 minutos min de leitura
Estratégia
1º de dezembro de 2025
Em ambientes complexos, planos lineares não bastam. O Estuarine Mapping propõe uma abordagem adaptativa para avaliar a viabilidade de mudanças, substituindo o “wishful thinking” por estratégias ancoradas em energia, tempo e contexto.

Manoel Pimentel - Chief Scientific Officer na The Cynefin Co. Brazil

10 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Liderança
29 de novembro de 2025
Por trás das negociações brilhantes e decisões estratégicas, Suits revela algo essencial: liderança é feita de pessoas - com virtudes, vulnerabilidades e escolhas que moldam não só organizações, mas relações de confiança.

Lilian Cruz - Fundadora da Zero Gravity Thinking

3 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança