Tecnologias exponenciais
5 min de leitura

Um olhar de telescópio sobre a inteligência artificial

O SXSW revelou o maior erro na discussão sobre IA: focar nos grãos de poeira (medos e detalhes técnicos) em vez do horizonte (humanização e estratégia integrada). O futuro exige telescópios, não lupas – empresas que enxergarem a IA como amplificadora (não substituta) da experiência humana liderarão a disrupção
Fernanda Nascimento é planejadora de Marketing, fundadora e CEO da Stratlab, empreendedora, estrategista digital centrada no cliente e especialista em marketing e vendas B2B, que estuda e cria estratégias de marketing digital para empresas B2B. Com mais de 30 anos de mercado, atua na Stratlab, criando planejamentos integrados que priorizam a experiência do cliente, geram leads e convertem em vendas de alta qualidade. Possui Master’s Degree em Marketing pelo Chartered Institute of Marketing, tem especialização em Liderança e Estratégia pelo Insper e Columbia University. É professora convidada na Lemonade School, FGV e ESPM, ministrando cursos de Marketing Digital aplicado às áreas de Marketing, Vendas e Recursos Humanos. É influencer para o LinkedIn e Gartner e colabora com artigos sobre Estratégias

Compartilhar:

Liderança, panorama, futuro

Muita gente que acompanhou os debates do SXSW, em Austin, talvez tenha sentido que parte da discussão estava focada no lugar errado. Em vez de enxergar o impacto da inteligência artificial com uma visão ampla, alguns pareciam presos a uma lupa, examinando cada detalhe minucioso, como se a poeira fosse mais importante do que o horizonte que se descortina.

Esse tipo de abordagem pode nos levar a perder de vista o verdadeiro potencial da IA. Em vez de ficarmos presos às preocupações sobre supostas ameaças, como a substituição de empregos ou a complexidade de sua implementação, precisamos expandir o olhar. A IA não é apenas sobre tecnologia ou softwares complicados. Ela já está transformando a forma como trabalhamos, consumimos e nos relacionamos. E, para acompanhar essa mudança, é essencial sair da análise fragmentada e adotar uma visão mais conectada e estratégica.

No evento, Sandy Carter, COO e fundadora da Unstoppable Domains, se propôs a desconstruir esses e outros mitos a respeito da IA. Um dos pontos de inflexão necessários para a compreensão plena do que estamos vivenciando é o de que a inteligência artificial transforma nossas vidas em muitos níveis, afetando sociedades e empresas em várias frentes.

Tratando mais especificamente de empresas e negócios, um dos erros cometidos atualmente ainda é o de departamentalizar a IA. O conceito precisa permear as decisões organizacionais de maneira holística e integrada. É uma cultura que tem de ser incorporada nos movimentos estratégicos e vivenciada como parte indispensável dos projetos. Kelly Smith Kenny, da AT&T, destacou essa necessidade em uma das sessões do SxSW – “Beyond AI Hype – Customer Centricity Tech Strategies” (além do hype da IA – estratégias tecnológicas centradas no cliente).

Por sinal, o cliente no centro, que vem sendo uma tendência tão propalada, é uma abordagem que necessitará cada vez mais das intervenções da IA. Como bem ressaltou Sandy Carter, 45% dos consumidores confiam em ferramentas de inteligência artificial para encontrar informações sobre marcas. As relações com esses clientes precisam ser estreitadas na medida da hiperpersonalização, e a adaptação das mensagens direcionadas a essas pessoas atingirão os níveis de individualização desejados através de mecanismos de IA.

Nesse cenário, um tema fundamental foi evidenciado nos painéis do SxSW: o da humanização. Esse é o olhar que passa a predominar, um nível de reflexão além dos questionamentos sobre até onde a tecnologia pode chegar na realização de tarefas e o quanto ela pode ser melhor que nós em determinadas funções.

Não é isso o que está em jogo. O desafio é outro. De uma vez por todas, a IA precisa ser encarada como um meio de potencializar a atuação humana. Tomá-la simplesmente como um recurso para automatizar atividades é um erro enorme. Sim, ela faz isso – mas não com o intuito de apenas simplificar ou encurtar caminhos. A grande e verdadeira disrupção é ampliá-los, abri-los no sentido de proporcionar ao fator humano mais tempo e condições de dedicar-se às atribuições mais estratégicas para os negócios.

A principal delas: atingir a excelência na experiência do cliente. E é justamente no cumprimento dessa missão que o ciclo virtuoso do uso da IA se completa e ao mesmo tempo se expande continuamente em suas inúmeras conexões possíveis. O consumidor busca jornadas verdadeiramente humanizadas, e saber conduzi-las com esse diferencial é o que vai determinar os cases de sucesso do mercado.

As novidades não vão parar de surgir. O próprio SxSW deu mostras disso, como a perspectiva de agentes de IA que consigam detectar as emoções humanas dos clientes para atingir patamares ainda mais aprofundados de hiperpersonalização. Aplicar a tecnologia mantendo a autenticidade da experiência torna-se, assim, o grande divisor entre avanços e retrocessos.

Como bem frisou a futurista Amy Webb, a tecnologia está redefinindo as formas como interagimos, pensamos e até sentimos. A questão é: como acompanhar, ou ainda. como liderar essa escalada sem ser acelerado ou impessoal? Essa foi a provocação feita por Douglas Rushkoff, escritor e teórico da mídia, no SxSW. Ele defendeu que a inovação tem de se voltar, como já foi um dia, à inovação genuína e à ruptura com o status quo, em vez de simplesmente seguir fórmulas previsíveis, formatadas e centradas apenas no lucro.

Voltemos á miopia de perder tempo com a poeira no microscópio. Precisamos enxergar além, em uma espécie de telescópio de perspectivas. Sem reducionismos. Um olhar que mescla o futuro e o presente, de certa forma já indistinguíveis em termos de possibilidades tecnológicas.

Muita gente que foi ao SXSW deve ter se encantado não só com as palestras, mas também com a paisagem de Austin. Mas apreciar a vista não é só olhar para o topo de suas colinas ou o reflexo em seus lagos, é entender o todo, a conexão entre os elementos. Com a tecnologia acontece o mesmo. Não dá para focar só no detalhe e perder a visão completa do que está acontecendo. O futuro e o presente já se misturam em possibilidades tecnológicas que não param de evoluir. A grande pergunta é: para onde você está olhando agora?

Compartilhar:

Artigos relacionados

Como superar o desafio da inovação com ambientes ainda informais?

Em um mercado onde donos centralizam decisões de P&D sem métricas críveis e diretores ignoram o design como ferramenta estratégica, Leme revela o paradoxo que trava nosso potencial: executivos querem inovar, mas faltam-lhes os frameworks mínimos para transformar criatividade em riqueza. Sua fala é um alerta para quem acredita que prêmios de design são conquistas isoladas – na verdade, eles são sintomas de ecossistemas maduros de inovação, nos quais o Brasil ainda patina.

A aposta calculada que levou o Boticário a ser premiado no iF Awards

Enquanto concorrentes correm para lançar coleções sazonais inspiradas em tendências efêmeras, o Boticário demonstra que compreende um princípio fundamental: o verdadeiro valor do design não está na estética superficial, mas em sua capacidade de gerar impacto social e econômico simultaneamente. A linha Make B., vencedora do iF Design Award 2025, não é um produto de beleza – é um manifesto estratégico.

Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Inovação & estratégia
9 de setembro de 2025
Experiência também é capital. O ROEx propõe uma nova métrica para valorizar o repertório acumulado de profissionais em times multigeracionais - e transforma diversidade etária em vantagem estratégica.

Fran Winandy e Martin Henkel

10 minutos min de leitura
Inovação
8 de setembro de 2025
No segundo episódio da série de entrevistas sobre o iF Awards, Clarissa Biolchini, Head de Design & Consumer Insights da Electrolux nos conta a estratégia por trás de produtos que vendem, encantam e reinventam o cuidado doméstico.

Rodrigo Magnago

2 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial, Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
5 de setembro de 2025
O maior desafio profissional hoje não é a tecnologia - é o tempo. Descubra como processos claros, IA consciente e disciplina podem transformar sobrecarga em produtividade real.

Diego Nogare

6 minutos min de leitura
Marketing & growth, Cultura organizacional, Inovação & estratégia, Liderança
4 de setembro de 2025
Inspirar ou limitar? O benchmark pode ser útil - até o momento em que te afasta da sua singularidade. Descubra quando olhar para fora deixa de fazer sentido.

Bruna Lopes de Barros

3 minutos min de leitura
Inovação
Em entrevista com Rodrigo Magnago, Fernando Gama nos conta como a Docol tem despontado unindo a cultura do design na organização

Rodrigo Magnago

4 min de leitura
ESG, Inovação & estratégia, Tecnologia & inteligencia artificial
3 de setembro de 2025
O plástico nasceu como símbolo do progresso - hoje, desafia o futuro do planeta. Entenda como uma invenção de 1907 moldou a sociedade moderna e se tornou um dos maiores dilemas ambientais da nossa era.

Anna Luísa Beserra - CEO da SDW

0 min de leitura
Inovação & estratégia, Empreendedorismo, Tecnologia & inteligencia artificial
2 de setembro de 2025
Como transformar ciência em inovação? O Brasil produz muito conhecimento, mas ainda engatinha na conversão em soluções de mercado. Deep techs podem ser a ponte - e o caminho já começou.

Eline Casasola - CEO da Atitude Inovação

5 minutos min de leitura
Liderança, Empreendedorismo, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Inovação & estratégia
1 de setembro de 2025
Imersão de mais de 10 horas em São Paulo oferece conteúdo de alto nível, mentorias com especialistas, oportunidades de networking qualificado e ferramentas práticas para aplicação imediata para mulheres, acelerando oportunidades para um novo paradigma econômico

Redação HSM Management

0 min de leitura
Inovação & estratégia, Marketing & growth
1 de setembro de 2025
Na era da creator economy, influência não é mais sobre alcance - é sobre confiança. Você já se deu conta como os influenciadores se tornaram ativos estratégicos no marketing contemporâneo? Eles conectam dados, propósito e performance. Em um cenário cada vez mais automatizado, é a autenticidade que converte.

Salomão Araújo - VP Comercial da Rakuten Advertising no Brasil

3 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Liderança
29 de agosto de 2025
Estamos entrando na temporada dos planos estratégicos - mas será que o que chamamos de “estratégia” não é só mais uma embalagem bonita para táticas antigas? Entenda o risco do "strategy washing" e por que repensar a forma como construímos estratégia é essencial para navegar futuros possíveis com mais consciência e adaptabilidade.

Lilian Cruz, Cofundadora da Ambidestra

4 minutos min de leitura