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O que alegra seu coração?

Celebrado por sua visão de design e seu empreendedorismo inovador, Steve Jobs deve ser visto também como um storyteller que falava a língua da paixão
Autor de Storytelling: aprenda a contar histórias com Steve Jobs, Papa Francisco, Churchill e outras lendas da liderança (ed. HSM), em cujos highlights este texto se baseia, é especialista em storytelling. Escreveu também TED – falar, convencer, emocionar: como se apresentar para grandes plateias e Faça como Steve Jobs.

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**Vender as ideias de um jeito que capture a imaginação do interlocutor era o principal diferencial do cofundador da Apple**

Steve Jobs, cofundador da Apple, foi um dos grandes storytellers de nossos tempos. Ele revolucionou o design de computadores pessoais, é claro, mas seu grande trunfo talvez tenha sido o storytelling. Sua habilidade de contar histórias permanece viva na carreira de ex-colegas, como Jonathan Ive, designer-chefe da Apple, Tim Cook, CEO da empresa, Tony Fadell, fundador da Nest Labs, e John Lasseter, executivo-chefe de criação da Disney e da Pixar. Ele inspirou todos a se comunicar de maneira diferenciada, vendendo suas ideias de um jeito que capture a imaginação do público. Quer um exemplo concreto de sua faceta de contador de histórias? 

Imagine a cena. O sol se punha sobre o rio Hudson em um dia frio dos anos 1980, e dois homens estavam no terraço de um luxuoso apartamento, ignorando a vista para o Central Park, em Nova York. Um deles, um rebelde de 26 anos vestindo blusa de gola olímpica e calça jeans, olhava para seus tênis de corrida havia um bom tempo sem falar uma palavra sequer. Então, mais rápido do que se pode acender a luz, virou-se para o homem a seu lado – um executivo bem-sucedido, a um mês de seu 45º aniversário – e falou as palavras que transformariam a carreira de ambos, além de mudar o mundo dos negócios para sempre: “Você quer vender água com açúcar pelo resto da vida ou ter a chance de mudar o mundo?”. 

John Sculley havia rejeitado a oferta de Jobs para comandar a Apple, alegando que pretendia continuar em sua posição na PepsiCo. A pergunta de Jobs, porém, forçou-o a fazer uma séria busca interior. “Eu engasguei porque sabia que ficaria o resto da vida pensando no que eu teria perdido”, recorda Sculley a respeito daquela pergunta que veio como um soco no estômago. 

Transformações radicais podem acontecer em um instante. No entanto, uma ideia só vai pegar se a pessoa que a teve puder convencer os outros a agir. Caso contrário, ideias são apenas neurônios atirando no cérebro de alguém. O maior desperdício é uma ideia não realizada que falha em se conectar com seu público, não porque seja uma ideia ruim, mas porque não está empacotada de maneira a fazer as pessoas se mexerem. 

Na sacada do apartamento, nos anos 1980, o que Sculley testemunhou foi o famoso “campo de distorção da realidade” de Steve Jobs, expressão cunhada para descrever seu misto de carisma com habilidade de convencer as pessoas de que elas poderiam realizar o impossível. 

Muitos anos mais tarde, em outubro de 2011, depois de ouvir a notícia da morte do cofundador da Apple, Sculley disse: “Steve era intensamente apaixonado por fazer a diferença na vida das pessoas”. E suas histórias sabiam realmente comunicar essa paixão. Não era à toa que cada apresentação pública de Jobs lembrava uma peça da Broadway, com todos os componentes clássicos de uma grande narrativa – cenários e surpresas, heróis e vilões. 

O storytelling explica Jobs. Praticamente todo grande líder de tecnologia – e quase todo jovem empreendedor, na verdade – agora tenta criar apresentações “ao estilo Steve Jobs”. Embora qualquer um possa copiar o design minimalista de suas apresentações, isso não vai adiantar até que (ou a menos que) se aprenda o real segredo do “dom de contar histórias” desse ex-hippie. E esse dom não estava em um slide. Estava em seu coração. 

**Paixão para dentro e para fora**

Desde que fundou a Apple, em 1976, com seu amigo Steve Wozniak, Jobs combinou paixão e lógica para criar conexões profundamente signifi cativas com o público. Sua capacidade de cativar pessoas é lendária. 

Por exemplo, depois de entrevistar, para meu livro _Faça como Steve Jobs_, seus colegas, designers de apresentações e pessoas que o conheciam melhor, descobri que seu segredo para cativar o público não estava no design dos slides, apesar de serem lindos. Agora, muitos líderes tentam imitar o estilo de apresentação de Steve Jobs (executivos da Apple ainda usam o mesmo padrão para grandes lançamentos de produto). Jobs captou nossa imaginação porque tinha grande apreço pela maneira como a tecnologia poderia mudar o mundo e teve coragem de expressar isso. 

Sua história começa com sua paixão. Você não conseguirá inspirar se não estiver inspirado. Paixão, porém, é um quebra-cabeça. Quase todas as pessoas sabem quando a veem nos outros, mas têm dificuldade de descobri-la para si mesmas. Steve Jobs descobriu sua paixão perguntando: “O que alegra meu coração?”. A resposta a essa pergunta é um tanto diferente da resposta a “O que eu faço?”. Jobs fazia computadores; construir ferramentas que ajudassem as pessoas a liberar sua criatividade era o que alegrava seu coração. 

A questão “o que alegra o coração de alguém” está no DNA da Apple. Tim Cook, o CEO, repete uma versão da frase em suas apresentações e lançamentos de produto. Ele perguntou certa vez: “O que faz seu coração bater?”. Em outra ocasião, no lançamento do novo iPad Air, em outubro de 2014, Cook estava falando sobre os altos índices de satisfação de clientes e disse: “É isso que alegra nosso coração”. 

Steve Jobs tinha a paixão na manga. Em 1997, voltou à companhia que havia cofundado depois de ter sido mandado embora 12 anos antes. Jobs fez uma reunião de equipe, na qual falou sobre o papel que a paixão teria para revitalizar a marca. 

“Marketing tem a ver com valores. E esse é um mundo muito complicado. É um mundo muito barulhento, e não teremos a oportunidade de as pessoas se lembrarem tanto de nós. Nenhuma empresa tem. Por isso, devemos ser muito claros sobre o que queremos que elas saibam a nosso respeito. Nossos clientes querem saber quem é a Apple e o que representamos. E o que não somos é fabricantes de caixas com as quais as pessoas possam fazer seus trabalhos, embora façamos isso bem. […] A Apple é mais do que isso. O principal valor da Apple é acreditar que gente com paixão pode mudar o mundo para melhor.” 

Em 12 de junho de 2005, Jobs fez um dos maiores discursos de formatura da história: 2.250 palavras em 15 minutos. Jobs, o storyteller, montou uma narrativa em três partes com base em um tema central: faça o que você ama. “Tenham a coragem de seguir seu coração e sua intuição. De alguma forma, eles já sabem o que vocês realmente querem ser”, disse ele aos graduandos. O discurso, supercomovente, teve mais de 20 milhões de visualizações no YouTube. 

Hoje, os funcionários da Apple falam com convicção que a paixão de Steve Jobs continua viva no DNA da empresa. Quando lançou uma nova versão de seu sistema operacional, o OS X, a Apple secretamente escondeu um presente, sabendo que alguém o descobriria. Incorporada ao processador de texto do Mac, o Pages, está a transcrição daquele discurso de formatura. A paixão é contagiosa. A paixão é irresistível. A paixão abastece a chama anterior.

 Pergunte-se agora: “O que alegra meu coração?”.

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