Mais do que um processo de controle, o orçamento pode – e deve – ser uma ferramenta viva de alinhamento estratégico, aprendizado e coerência organizacional. Todo ciclo de gestão começa com uma pergunta essencial: por que fazemos o que fazemos?
Essa é também a pergunta que deveria orientar todo processo orçamentário. Quando o orçamento é tratado apenas como um exercício de controle, ele cumpre uma função técnica, mas perde sua razão de existir – que é direcionar a organização com propósito, coerência e visão de futuro. Nos últimos anos, o papel do orçamento dentro da governança corporativa vem mudando de forma significativa.
A pesquisa CFO Trends 2026, conduzida pela Evermonte Institute, mostra que 77,7 % dos CFOs consideram “decidir onde investir e com que retorno” a competência mais determinante para os próximos anos. Esse dado revela uma transição clara: o orçamento deixa de ser uma fotografia estática e passa a ser uma ferramenta dinâmica de alocação estratégica de capital, medição de retorno e disciplina financeira.
Esse movimento está alinhado às conclusões do Global Finance Trends Survey 2024, da Protiviti, que aponta a integração entre planejamento financeiro, risco e estratégia como uma das principais prioridades dos líderes financeiros globais. Mais do que planejar gastos, a boa governança exige que cada decisão orçamentária traduza uma escolha consciente – e que cada recurso aplicado expresse uma convicção estratégica.
Em empresas maduras, o orçamento se torna um elo entre propósito e execução. Não é apenas o mapa de onde se quer chegar, mas também o espelho de como a cultura organizacional decide alocar energia, tempo e capital. Quando há governança, o orçamento vira conversa: entre gestão e conselho, entre curto e longo prazo, entre ambição e prudência.
Nesse diálogo, o papel dos conselhos é cada vez mais relevante. O OECD Corporate Governance Factbook 2025 reforça que a supervisão do processo orçamentário é uma das responsabilidades críticas do board, não apenas para aprovar metas, mas para garantir coerência entre as premissas e os riscos assumidos. Gestão e conselho, cada um no seu papel, constroem juntos a previsibilidade e a resiliência de longo prazo.
É nesse contexto que o Orçamento Base Zero (OBZ) volta ao centro das discussões – não como ferramenta de austeridade, mas como instrumento de revisão estratégica. Ao obrigar cada área a justificar seus custos e investimentos a partir do zero, o OBZ promove uma cultura de questionamento e alinhamento, fortalecendo o vínculo entre estratégia e execução. Segundo estudos recentes publicados no Journal of Risk and Financial Management (MDPI, 2024) e no PMC Journal (Chandawarkar, 2024), metodologias que unem governança financeira e aprendizado contínuo – como o OBZ – estão entre as mais promissoras para gerar eficiência sem perder visão de longo prazo.
Previsibilidade, nesse cenário, não significa rigidez. Significa ter capacidade de ajustar a rota sem perder o rumo, de agir com base em fatos, não em suposições. Um bom orçamento não é o que tenta prever tudo, mas o que oferece clareza suficiente para decisões conscientes, mesmo em meio à incerteza.
Empresas que aprendem com seus orçamentos – e não apenas as que os cumprem – são as que evoluem. O orçamento deixa de ser uma ferramenta de cobrança e passa a ser um mecanismo de aprendizado organizacional – algo que a governança reconhece, acompanha e aprimora a cada ciclo. No fim, governança e orçamento têm o mesmo propósito: criar coerência. Coerência entre ambição e realidade, entre crescimento e caixa, entre discurso e prática.
Quando o orçamento é tratado como instrumento de estratégia, ele reflete uma cultura que pensa antes de gastar, mede antes de agir e aprende antes de repetir.




