ESG
6 min de leitura

Semana Mundial do Meio Ambiente: desafios e oportunidades para a agenda de sustentabilidade

Construímos um universo de possibilidades. Mas a pergunta é: a vida humana está realmente melhor hoje do que 30 anos atrás? Enquanto brasileiros — e guardiões de um dos maiores biomas preservados do planeta — somos chamados a desafiar as retóricas de crescimento e consumo atuais. Se bem endereçados, tais desafios podem nos representar uma vantagem competitiva e um fôlego para o planeta
Sócio-diretor da Muda Cultural.

Compartilhar:

Há muito se fala de “sustentabilidade”. Me deparei esta semana com uma conhecida relembrando que, no início dos anos 90, o assunto do momento nas escolas era a Rio 92. Professores de todo país propunham que os alunos desenhassem e pintassem cenários da floresta Amazônica e outros biomas de nosso país. De lá pra cá, parece que o mundo deu uma volta completa e o Brasil volta a ocupar o protagonismo com a chegada COP 30, uma das mais importantes conferências sobre o meio ambiente e a sustentabilidade do nosso planeta Terra. 

Daqui pra lá, há também a sensação de que não houve grandes avanços e que continuamos em um transatlântico desgovernado, ainda reagindo aos efeitos caóticos de 2025. Há não muito tempo se fala a palavra “inovação”, termo que parece realmente muito novo, mas que, de certa forma, apenas tenta condensar nosso fetiche pelos avanços da ciência, da tecnologia e dos modelos de negócio. Claro que a inserção de novos paradigmas e novas demandas ao cada vez mais dinâmico ambiente de startups foi responsável pela criação de novíssimas grandes empresas e pela queda de muitos “gigantes”. Porém, o que devemos nos perguntar é o que efetivamente isso representou para a vida em nosso planeta. 

Inventamos um universo de possibilidades, mas é difícil dizer que estamos em uma posição melhor do que há 30 anos em termos de habitabilidade humana. Como já foi amplamente divulgado na imprensa, em 2024 ultrapassamos a barreira de aquecimento de 1,5º C do planeta — fato que, se consolidado, afetará a vida na Terra de forma irreversível. A vida nos oceanos, nosso principal “produtor” de oxigênio global, talvez nunca esteve tão ameaçada; a viabilidade financeira e econômica de uma transição energética que atenda de forma efetiva às necessidades e a urgência atual nos parece tão distante quanto o telescópio espacial James Webb pode enxergar. Há quem fale em quase US$15 trilhões, segundo dados da Climate Policy Initiative publicados pelo Financial Times, há quem fale em mais de US$100 trilhões até 2050, quantia indecifrável. Enquanto desafios como esses se impõem perante a agenda da viabilidade da vida humana, retóricas como a do crescimento e a do consumo seguem praticamente intactas.

E o Brasil com isso? Nosso país emerge num cenário potencialmente bem posicionado, onde, estranhamente, em um mundo onde a China, que mais investe em energias renováveis no planeta, também é o que mais polui, segundo dados do Climate Watch. Em “oposição”, os EUA, ainda maior potência mundial, vira as costas para qualquer discussão séria sobre sustentabilidade e, desconfio, qualquer discussão séria no geral. Talvez por força do acaso, sem muito planejamento e sem necessariamente uma visão estratégica nacional num primeiro momento, o Brasil atual é dono de uma matriz energética razoavelmente limpa. Possui em seu território um dos maiores biomas preservados do planeta e vem fazendo algumas lições de casa, sobre seu arcabouço regulatório. Isso pode representar uma grande vantagem competitiva e um respiro para todas e todos! Mesmo assim, desafios como o esdrúxulo PL, que versa sobre o licenciamento ambiental e agora tramita no Congresso, representam grandes ameaças ao nosso lugar de autoridade no âmbito da sustentabilidade. 

Nunca se fez tão necessário o planejamento do Estado para que consigamos superar os desafios que nossa existência nos traz. Neste sentido, só em 2024, o Brasil conseguiu tirar do papel — e está colocando em prática — regulações que versam sobre sua economia de créditos de carbono, dando maior segurança jurídica para este mercado. Além disso, finalmente começamos a endereçar um dos nossos grandes problemas: a coleta seletiva. Por meio de uma série de mecanismos que regulamentam a geração e a comercialização de créditos de reciclagem, tentamos estancar o rombo de subvalorização e da falta de confiabilidade do setor. 

Considerando ainda que, em um país em que a porcentagem de reciclagem global dos seus resíduos se aproxima a zero — estamos falando de aproximadamente 4%, segundo dados disponibilizados pela ABRELPE —, o tema por si só já deveria ser tratado como uma das prioridades mais urgentes. Nesse contexto, foi regulamentada a Lei da Reciclagem, mecanismo que viabiliza investimentos na cadeia da reciclagem por meio da destinação fiscal de empresas em território nacional. Mais do que uma formalidade legal, trata-se de um movimento que começa a dar forma ao que faltava: segurança jurídica, confiança nos setores estratégicos ligados à sustentabilidade e, principalmente, recursos. Só no primeiro ano, segundo o Governo Federal, mais de R$300 milhões foram injetados diretamente por meio de incentivos fiscais via Lei da Reciclagem. É pouco, mas é algo concreto.

Temos tentado trabalhar a transição para uma matriz energética 100% “limpa” através de esforços no mercado de energias renováveis, como eólica e solar, com regulamentações sobre o mercado livre de energia e outras estruturas. Além disso, muito tem se falado — e investido — em um futuro hidrogênio “verde”, uma aposta que poderá se consolidar como uma matriz energética importante em alguns anos. Também não podemos nos esquecer do etanol, que chegou à sua segunda geração, graças a esforços de importantes órgãos de pesquisa e inovação estatais como a EMBRAPA. Esta sim uma realidade que já mostra o potencial do Brasil como produtor de biocombustíveis “limpos” e como liderança nos desafios de uma transição para a produção de energia cada vez mais sustentável. 

Como desafios, somamos a estes pontos o início das pesquisas para exploração de um dos maiores campos de petróleo em alto mar descobertos até o momento, na região Norte, assim como a proposição de financiamentos relevantes para a construção de novas usinas de carvão em nosso território. Mazelas impulsionadas pela falta de planejamento e pela ânsia do crescimento e do consumo. 

Apesar dessas contradições, vivemos em um país que, ao menos, quer discutir e tentar endereçar de forma efetiva questões triviais para o planeta, com investimentos que viabilizem minimamente um ambiente de inovação sustentável. Um Brasil que precisa, cada vez mais, fazer da sustentabilidade uma “arma” em um mundo que, a cada dia, caminha rumo à insustentabilidade. De certa forma, seguimos remando um pouco (não muito) contra a maré, sabendo que uma ou poucas andorinhas não farão verão. De toda forma, nosso primeiro objetivo é apenas tentar passar por este inverno, na esperança de que as próximas gerações receberão de nós um planeta “minimamente” funcional e habitável.

Compartilhar:

Artigos relacionados

A aposta calculada que levou o Boticário a ser premiado no iF Awards

Enquanto concorrentes correm para lançar coleções sazonais inspiradas em tendências efêmeras, o Boticário demonstra que compreende um princípio fundamental: o verdadeiro valor do design não está na estética superficial, mas em sua capacidade de gerar impacto social e econômico simultaneamente. A linha Make B., vencedora do iF Design Award 2025, não é um produto de beleza – é um manifesto estratégico.

Inovação
25 de agosto de 2025
A importância de entender como o design estratégico, apoiado por políticas públicas e gestão moderna, impulsiona o valor real das empresas e a competitividade de nações como China e Brasil.

Rodrigo Magnago

9 min de leitura
Cultura organizacional, ESG, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
25 de agosto de 2025
Assédio é sintoma. Cultura é causa. Como ambientes de trabalho ainda normalizam comportamentos abusivos - e por que RHs, líderes e áreas jurídicas precisam deixar a neutralidade de lado e assumir o papel de agentes de transformação. Respeito não pode ser negociável!

Viviane Gago, Facilitadora em desenvolvimento humano

5 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Estratégia, Inovação & estratégia, Tecnologia e inovação
22 de agosto de 2025
Em tempos de alta complexidade, líderes precisam de mais do que planos lineares - precisam de mapas adaptativos. Conheça o framework AIMS, ferramenta prática para navegar ambientes incertos e promover mudanças sustentáveis sem sufocar a emergência dos sistemas humanos.

Manoel Pimentel - Chief Scientific Officer na The Cynefin Co. Brazil

8 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Finanças, Marketing & growth
21 de agosto de 2025
Em tempos de tarifas, volta de impostos e tensão global, marcas que traduzem o cenário com clareza e reforçam sua presença local saem na frente na disputa pela confiança do consumidor.

Carolina Fernandes, CEO do hub Cubo Comunicação e host do podcast A Tecla SAP do Marketês

4 minutos min de leitura
Uncategorized, Empreendedorismo, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
20 de agosto de 2025
A Geração Z está redefinindo o que significa trabalhar e empreender. Por isso é importante refletir sobre como propósito, impacto social e autonomia estão moldando novas trajetórias profissionais - e por que entender esse movimento é essencial para quem quer acompanhar o futuro do trabalho.

Ana Fontes

4 minutos min de leitura
Inteligência artificial e gestão, Transformação Digital, Cultura organizacional, Inovação & estratégia
18 de agosto de 2025
O futuro chegou - e está sendo conversado. Como a conversa, uma das tecnologias mais antigas da humanidade, está se reinventando como interface inteligente, inclusiva e estratégica. Enquanto algumas marcas ainda decidem se vão aderir, os consumidores já estão falando. Literalmente.

Bruno Pedra, Gerente de estratégia de marca na Blip

3 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Estratégia, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
15 de agosto de 2025
Relatórios de tendências ajudam, mas não explicam tudo. Por exemplo, quando o assunto é comportamento jovem, não dá pra confiar só em categorias genéricas - como “Geração Z”. Por isso, vale refletir sobre como o fetiche geracional pode distorcer decisões estratégicas - e por que entender contextos reais é o que realmente gera valor.

Carol Zatorre, sócia e CO-CEO da Kyvo. Antropóloga e coordenadora regional do Epic Latin America

4 minutos min de leitura
Liderança, Bem-estar & saúde, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
14 de agosto de 2025
Como a prática da meditação transformou minha forma de viver e liderar

Por José Augusto Moura, CEO da brsa

5 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
14 de agosto de 2025
Ainda estamos contratando pessoas com deficiência da mesma forma que há décadas - e isso precisa mudar. Inclusão começa no processo seletivo, e ignorar essa etapa é excluir talentos. Ações afirmativas e comunicação acessível podem transformar sua empresa em um espaço realmente inclusivo.

Por Carolina Ignarra, CEO da Talento Incluir e Larissa Alves, Coordenadora de Empregabilidade da Talento Incluir

5 minutos min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas, Estratégia
13 de agosto de 2025
Lideranças que ainda tratam o tema como secundário estão perdendo talentos, produtividade e reputação.

Tatiana Pimenta, CEO da Vittude

2 minutos min de leitura