Gestão de Pessoas, Estratégia e Execução, Liderança, Times e Cultura, Saúde Mental
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Sua empresa pratica o carewashing?

*Carine Roos é pesquisadora de ética em inteligência artificial, direitos humanos, saúde emocional e gênero. A especialista possui mestrado em Gênero pela London School of Economics (LSE) e pós-graduação em Cultivando Equilíbrio Emocional pelo Santa Barbara Institute for Consciousness Studies. Fundadora e CEO da Newa, consultoria de impacto social especializada na criação de ambientes corporativos humanizados, éticos e psicologicamente seguros, tem como missão preparar e capacitar líderes de grandes empresas. Autora da newsletter The Hidden Politics of AI, que analisa o impacto das big techs na governança digital e nos direitos fundamentais, também é palestrante em eventos de inovação, LinkedIn Top Voice, e colunista em veículos como Você RH e HSM.

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Uma empresa contrata uma palestra de gerenciamento de tempo para melhorar o bem-estar das pessoas. Durante o workshop, os participantes recebem um e-mail da liderança pedindo uma tarefa “urgente” para o dia seguinte. A organização tem uma meta clara de contratar mulheres e deixa claro nos anúncios de vagas, mas não são transparentes em relação ao plano de carreira e praticam a discriminação salarial baseada em gênero. Há denúncia de caso de assédio sexual e a liderança banaliza o ocorrido, oferece um suporte superficial para a vítima e até incentiva a lei do silêncio para não prejudicar a carreira dos envolvidos.

Essas três situações, que, infelizmente, ainda são comuns nas empresas, são exemplos de “carewashing”, um termo que se refere à prática de empresas que proclamam um compromisso com o bem-estar dos colaboradores, mas não oferecem um ambiente de trabalho saudável e de apoio de fato. Similar ao conceito de greenwashing, onde empresas exageram suas práticas ambientais para ganhar reputação, o carewashing é a propaganda enganosa sobre o cuidado com o time. Um tipo comum é o relato seletivo, em que as organizações divulgam apenas os aspectos positivos de seu impacto social, ignorando ou minimizando quaisquer comportamentos negativos.

O carewashing tem consequências prejudiciais tanto para a empresa quanto para os colaboradores. A desconexão entre a retórica e a realidade pode levar à desconfiança, desengajamento e aumento da rotatividade. Colaboradores que percebem a falta de genuinidade nos esforços da empresa tendem a se sentir desvalorizados, o que pode resultar em absenteísmo, presenteísmo e um clima de desmotivação e infelicidade.

As empresas podem recorrer ao carewashing por diversos motivos. A pressão competitiva é um fator relevante, pois, para permanecerem relevantes no mercado, as organizações sentem a necessidade de demonstrar um compromisso social, mesmo que superficial. Além disso, a pressão regulatória e a gestão da reputação também impulsionam essa prática. Muitas empresas usam o carewashing para aparentar conformidade com os requisitos de impacto social e ambiental, evitando mudanças substanciais.

Em um momento em que o bem-estar tem sido inequivocamente vinculado ao desempenho organizacional, os líderes devem fazer tudo o que estiver ao seu alcance para fornecer locais de trabalho saudáveis ​​e motivadores.

É essencial destacar o papel central das emoções como parte fundamental das políticas de cuidado com as pessoas em uma organização. As emoções moldam atitudes, comportamentos, normas e práticas no ambiente profissional. Embora já tenhamos feito algum progresso, ainda há um grande potencial a ser construído por líderes e equipes para desenvolver uma cultura de segurança psicológica saudável e produtiva.

Para se ter uma noção do efeito que uma cultura insegura psicologicamente tem para os colaboradores: a terceira edição do estudo Inteligência Emocional e Saúde Mental no Ambiente de Trabalho, realizado pela The School of Life, em parceria com a Robert Half, mapeou que para mais de 42% dos 387 colaboradores entrevistados, o ambiente tóxico é o principal fator que os faria pedir demissão. Outras razões citadas foram a falta de reconhecimento  (percepção de 13% dos respondentes), imposição do modelo 100% presencial (13%), falta de plano de carreira (8%) e de protagonismo (3%).

Para enfrentar os sentimentos negativos no ambiente de trabalho, os líderes devem abordar corajosamente uma cultura de cuidado, em vez de permitir, tolerar, recompensar ou modelar comportamentos tóxicos que contribuem para esses sentimentos. Comprometer-se com o bem-estar genuíno das pessoas requer humildade, autoconsciência, autenticidade e integridade em todos os níveis de interação.

Algumas medidas que podem ser adotadas incluem:

1) Programas de conscientização e treinamento: Implementar programas de conscientização sobre saúde mental e oferecer treinamento para identificação de sinais de estresse e saúde mental em lideranças e colaboradores.

2) Apoio para o florescimento emocional: Fornecer recursos para o desenvolvimento de lideranças humanizadas e disponibilizar serviços de apoio psicológico e ferramentas de autoconhecimento.

3) Cultura organizacional: Promover um ambiente psicologicamente saudável onde as pessoas possam compartilhar suas expectativas, dores e vulnerabilidades, e incentivar a comunicação aberta com uma escuta ativa, empática e compassiva.

4) Flexibilidade no trabalho: Oferecer opções de trabalho flexíveis a fim de equilibrar as demandas profissionais e pessoais respeitando as necessidades de cada um, e incentivar a gestão de tempo eficaz e evitar sobrecarga de tarefas que podem, lá na frente, ser a causa de burnout.

5) Políticas de licença e descanso: Garantir que as pessoas tenham acesso a licenças e períodos de descanso adequados para recuperação física e mental, além de estabelecer políticas que incentivem o uso efetivo desses benefícios.

6) Ambiente de trabalho saudável: Criar um ambiente de trabalho que promova o bem-estar com espaços dedicados para relaxamento e pausas, e incentivar práticas como pausas curtas, exercícios físicos e intervalos regulares.

7) Definir expectativas realistas: Estabelecer expectativas realistas em relação às responsabilidades, prazos e metas, e encorajar a delegação eficiente de tarefas e a construção de equipes de alta performance abandonando o modelo comando/controle.

8) Monitoramento e feedback constante: Implementar sistemas de monitoramento para identificar sinais precoces de estresse ou esgotamento, e oferecer feedback construtivo e uma política de calling in e calling out.

9) Incentivar o equilíbrio entre vida profissional e pessoal: Promover uma abordagem equilibrada entre a vida profissional e pessoal, e incentivar as pessoas a reservar tempo para atividades fora do trabalho que promovam relaxamento e diversão.

10) Avaliação regular das práticas: Realizar avaliações regulares das práticas e políticas relacionadas à saúde mental, e adaptar as estratégias com base nos feedbacks e nas demandas do ambiente de trabalho.

A construção de um ambiente de trabalho autêntico e saudável vai muito além de slogans e iniciativas superficiais. É um compromisso contínuo que exige ações concretas e alinhadas com os valores da organização. Somente quando as empresas priorizarem verdadeiramente o bem-estar de seus colaboradores e integrarem esse compromisso em sua cultura organizacional, poderão alcançar resultados sustentáveis e duradouros. O desafio para os líderes é transformar palavras em práticas efetivas, criando um legado de confiança, respeito e cuidado genuíno que inspire e motive todos os que fazem parte da jornada.

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