Tecnologias exponenciais
7 min de leitura

A inteligência artificial está diminuindo o seu QI — ou é o uso passivo que está enfraquecendo a sua mente?

Já notou que estamos tendo estas sensações, mesmo no aumento da produção?
Cientista, desenvolvedor de neurotecnologias e entusiasta dos negócios de impacto social. Leandro é CEO na CogniSigns e expert na Singularity Brazil em Neurotecnologia.

Compartilhar:

Vivemos em uma era onde a inteligência artificial, mais especificamente a IA generativa, assumiu um lugar central em nossa vida profissional, educacional e até pessoal. Nunca foi tão fácil obter respostas, criar textos, gerar imagens ou tomar decisões com base em algoritmos que aprendem e se adaptam.

Diante de tanta conveniência, uma questão inquietante se impõe: será que estamos, aos poucos, deixando de pensar? E mais: estaríamos condicionando nosso cérebro a operar em piloto automático, deixando que a tecnologia raciocine por nós?

Essa pergunta não nasce de alarmismo, mas de evidências. Vários estudos apontam que, em países ocidentais, o QI médio está em declínio — uma tendência conhecida como “Efeito Flynn Reverso”. Durante o século XX, os testes de inteligência apontavam uma melhora contínua no desempenho cognitivo das populações. Esse avanço foi atribuído à melhoria na educação, à urbanização e à exposição crescente à resolução de problemas complexos. No entanto, nas últimas duas décadas, essa curva positiva começou a se inverter.

E o que mudou nesse intervalo?

A mudança não está apenas na quantidade de estímulos digitais aos quais estamos expostos, mas principalmente na qualidade da nossa interação com esses estímulos. A velocidade da informação e a fragmentação da atenção criaram um ambiente onde o pensamento linear, profundo e analítico é cada vez mais raro — substituído por respostas prontas, atalhos mentais e raciocínio superficial.

A inteligência artificial generativa entrou nesse cenário como catalisadora. Embora seja uma tecnologia fascinante — e, usada corretamente, extremamente poderosa — ela carrega um risco silencioso: a passividade intelectual.

O risco do piloto automático

O perigo não está na IA em si, mas na forma como a utilizamos. Quando deixamos de refletir criticamente sobre as informações que recebemos, de investigar além da primeira resposta gerada, ou de construir raciocínios próprios a partir da base fornecida pela máquina, estamos reduzindo nossa capacidade de pensar — e não otimizando-a.

Ao terceirizar consistentemente processos cognitivos para a IA, deixamos de exercitar áreas fundamentais do cérebro relacionadas ao julgamento, à criatividade, à memória de trabalho e à resolução de problemas complexos. É como se estivéssemos treinando nossa mente a ser menos exigente — menos ativa.

Essa é uma diferença fundamental entre usar a IA como propulsora da mente e acioná-la no piloto automático. No primeiro caso, ela amplia nossas capacidades; no segundo, adormece nosso potencial.

O contraste geográfico e cultural

Curiosamente, enquanto o Ocidente enfrenta essa possível “fadiga cognitiva digital”, em países do Oriente — como Japão, Coreia do Sul e Singapura — o movimento é outro. Nesses países, o QI médio segue em crescimento, e a IA tem sido integrada ao cotidiano de forma disciplinada, especialmente nos sistemas educacionais.

Lá, a tecnologia é vista como uma ferramenta de aprofundamento, não de substituição. Ela está a serviço do rigor intelectual, da excelência acadêmica e do estímulo à resolução de problemas de forma autônoma. A cultura digital nesses países valoriza o esforço cognitivo como parte do processo de crescimento — e não como algo a ser evitado.

Esse contraste nos convida a refletir sobre o modelo cultural de uso da tecnologia que estamos incentivando. Estamos criando ambientes que desafiam o pensamento ou que apenas nos recompensam pela velocidade das respostas?

IA e o desenvolvimento de altas habilidades

Essa discussão também é central no campo da neuroeducação. Além de trabalhar com inteligência artificial e neurociência aplicada à tomada de decisão, atuo na identificação e potencialização de pessoas com altas habilidades, especialmente crianças e jovens com capacidades cognitivas e criativas muito acima da média.

Ao longo dos últimos anos, percebi um padrão recorrente: mesmo indivíduos com potencial extraordinário podem atrofiar seu desenvolvimento se forem expostos a um ambiente que não os desafia cognitivamente. E esse é justamente o risco da má aplicação da IA: transformar mentes brilhantes em mentes dependentes.

Por outro lado, quando a IA é usada como aliada da investigação, da síntese e da construção de pensamento, ela se torna uma ferramenta riquíssima para ampliar habilidades — inclusive as mais elevadas. Em projetos educacionais e programas de mentoria com jovens talentos, temos visto resultados impressionantes quando a IA é integrada como recurso de estímulo ao pensamento criativo, lógico e analítico.

Inteligência Híbrida: uma via de expansão

Diante desse cenário, proponho a ideia da Inteligência Híbrida — um conceito que representa a convergência entre a inteligência natural (humana) e a inteligência artificial. Mais do que uma soma, essa integração é uma multiplicação de possibilidades.

A Inteligência Híbrida parte do princípio de que não devemos competir com a IA, mas aprender a pensar junto com ela. Isso significa treinar nossa mente para interagir criticamente com as sugestões da IA, testar hipóteses, validar respostas, construir raciocínios próprios e ir além do que é proposto.

Assim como o cérebro humano fortalece suas sinapses pela repetição e desafio, a IA também melhora com o uso qualificado. É nesse ponto que a colaboração entre as duas inteligências se torna poderosa — desde que a humana siga ativa, desperta e curiosa.

O desafio está lançado

Não se trata de rejeitar a tecnologia, mas de desenvolver um novo tipo de alfabetização: o letramento cognitivo para a era da IA. Precisamos aprender a usar essas ferramentas de forma intencional, estratégica e crítica. Caso contrário, corremos o risco de formar uma geração que sabe operar comandos, mas não sabe pensar profundamente.

A pergunta que deixo é: como você tem usado a IA? Como um estímulo à sua inteligência — ou como uma fuga dela?

A resposta a essa pergunta pode dizer mais sobre o seu futuro do que qualquer algoritmo.

Compartilhar:

Cientista, desenvolvedor de neurotecnologias e entusiasta dos negócios de impacto social. Leandro é CEO na CogniSigns e expert na Singularity Brazil em Neurotecnologia.

Artigos relacionados

A aposta calculada que levou o Boticário a ser premiado no iF Awards

Enquanto concorrentes correm para lançar coleções sazonais inspiradas em tendências efêmeras, o Boticário demonstra que compreende um princípio fundamental: o verdadeiro valor do design não está na estética superficial, mas em sua capacidade de gerar impacto social e econômico simultaneamente. A linha Make B., vencedora do iF Design Award 2025, não é um produto de beleza – é um manifesto estratégico.

Liderança
70% dos líderes não enxergam seus pontos cegos e as empresas pagam o preço. O antídoto? Autenticidade radical e 'Key People Impact' no lugar do controle tóxico

Poliana Abreu

7 min de leitura
Liderança
15 lições de liderança que Simone Biles ensinou no ATD 2025 sobre resiliência, autenticidade e como transformar pressão em excelência.

Caroline Verre

8 min de leitura
Liderança
Conheça 6 abordagens práticas para que sua aprendizagem se reconfigure da melhor forma

Carol Olinda

4 min de leitura
Cultura organizacional, Estratégia e execução
Lembra-se das Leis de Larman? As organizações tendem a se otimizar para não mudar; então, você precisa fazer esforços extras para escapar dessa armadilha. Os exemplos e as boas práticas deste artigo vão ajudar

Norberto Tomasini

4 min de leitura
Carreira, Cultura organizacional, Gestão de pessoas
A área de gestão de pessoas é uma das mais capacitadas para isso, como mostram suas iniciativas de cuidado. Mas precisam levar em conta quatro tipos de necessidades e assumir ao menos três papéis

Natalia Ubilla

3 min de leitura
Estratégia
Em um mercado onde a reputação é construída (ou desconstruída) em tempo real, não controlar sua própria narrativa é um risco que nenhum executivo pode se dar ao luxo de correr.

Bruna Lopes

7 min de leitura
Liderança
O problema está na literatura comercial rasa, nos wannabe influenciadores de LinkedIn, nos só cursos de final de semana e até nos MBAs. Mas, sobretudo, o problema está em como buscamos aprender sobre a liderança e colocá-la em prática.

Marcelo Santos

8 min de leitura
ESG
Inclua uma nova métrica no seu dashboard: bem-estar. Porque nenhum KPI de entrega importa se o motorista (você) está com o tanque vazio

Lilian Cruz

4 min de leitura
ESG
Flexibilidade não é benefício. É a base de uma cultura que transformou nossa startup em um caso real de inclusão sem imposições, onde mulheres prosperam naturalmente.

Gisele Schafhauser

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
O futuro da liderança em tempos de IA vai além da tecnologia. Exige preservar o que nos torna humanos em um mundo cada vez mais automatizado.

Manoel Pimentel

7 min de leitura