Diversidade, ESG

Por que a equidade salarial ainda não contempla adequadamente as pessoas com deficiência?

Lei de Equidade Salarial negligencia inclusão de pessoas com deficiência e a lacuna persiste: "uma urgência social e trabalhista".
É sócio e COO da Egalite, conselheiro do Instituto EY e da Handtalk, psicólogo, comunicador e docente dos MBAs de Recursos Humanos e Desenvolvimento de Gestores da FGV, professor da Fundação Dom Cabral, HSM University, Escola de Comunicação ABERJE e da Pós-graduação em Cuidados Paliativos do Hospital Sírio-Libanês. É CEO da REIS - Rede Empresarial de Inclusão Social. Representa o Brasil anualmente na conferência internacional da OIT em Genebra sobre inclusão da pessoa com deficiência e o futuro do trabalho.

Compartilhar:

Recentemente, a Lei nº 14.611 de 03 de Julho de 2023, virou pauta e foco de empresas com 100 ou mais colaboradores tiveram até o último mês de março, a obrigação de publicar com trasparência a remuneração de profissionais com cargos equivalentes.

A Lei busca corrigir eventuais inequidades salariais e promover a isonomia salarial sob pena de multa que pode chegar até 3% da inequidade total verificada entre homens e mulheres. E caso comprovada, as empresas deverão elaborar e implementar o Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens.

Este plano visa detalhar as ações a serem tomadas, juntamente com as metas e prazos estabelecidos. Além disso, propõe a criação de programas de treinamento para gestores, líderes e colaboradores sobre a importância da igualdade de gênero no ambiente de trabalho. Também destaca a importância da promoção da diversidade e inclusão, bem como programas de capacitação para mulheres, visando sua entrada, permanência e progressão no mercado de trabalho.

Temos aqui a promessa de um ambiente mais justo, com mais equidade e transparente para os trabalhadores. No entanto, uma importante lacuna persiste: a inclusão das pessoas com deficiência nesse contexto.

Embora o decreto tenha estabelecido medidas para combater a discriminação salarial entre homens e mulheres e criado canais para denúncias, a equidade salarial para pessoas com deficiência continua sendo um ponto negligenciado.

Ainda há uma falta significativa de políticas e práticas específicas destinadas a garantir que trabalhadores com deficiência sejam remunerados de forma justa e igualitária. E a nova lei, embora tenha plano robusto de mitigação sequer cita o tema de profisisonais com deficiência. O que me faz pensar: o que precisa acontecer socialmente para que esta pauta se torne um tema permanente e urgente? Mais uma trajédia com um grupo minorizado?

A equiparação salarial é uma questão fundamental no cenário trabalhista, buscando assegurar a justiça e a igualdade entre os empregados. No entanto, é preocupante que, mesmo com medidas recentes, a equidade salarial para pessoas com deficiência não estejam recebendo a devida atenção.

Segundo dados da PNAD, em 2022, as pessoas com deficiência tiveram um rendimento médio mensal habitualmente recebido em todos os trabalhos (R$1.913) que corresponde a apenas 68,9% do rendimento médio das pessoas sem deficiência (R$ 2.777). A ONU Mulheres aponta que mulheres recebem até 30% menos. E como vemos, Pessoas com defiência, quase 70% menos. E a quem serve essa inequidade?

Quando olhamos de forma interseccional, as mulheres com deficiência têm rendimentos ainda menores (R$ 1.598), equivalentes a 72% do que os homens com deficiência recebiam e 65,9% do que as mulheres sem deficiência recebiam. As pessoas com deficiência estão sub-representadas na condição de empregadas no setor privado (35,4%).

Pessoas com deficiência também ganham menos do que as pessoas sem deficiência com o mesmo nível de instrução. Em superior completo, a desigualdade chega a 79% com uma média de rendimentos de (R$ 5.591) entre pessoas sem deficiência, contra (R$ 4.445) de pessoas com deficiência.

Não me admira.

O Ministro do Trabalho vem buscando à luz do dia a flexibilização da “Lei de Cotas” (Artigo 93 da Lei 8.213/91) para pessoas com deficiência, pois como disse recentemente o chefe da pasta: “um amigo do setor de limpeza urbana disse que não consegue cumprir e então, precisamos flexibilizar [essa lei]”. Considerando que mais de 5 milhões de pessoas com deficiência possuem ensino médio ou superior, a oferta de talentos qualificados é abundante, o que torna infundada qualquer proposta de flexibilização na legislação.

Temos ainda, A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU), ratificada no Brasil com equivalência de emenda constitucional pelo Decreto Legislativo nº 186/2008 e Decreto nº 6.949/2009: em seus artigos 1º, 5º, 8º, 17º e 27º, dispõe sobre como devemos enquanto País promover, proteger e assegurar os direitos das pessoas com deficiência especialmente no quesito trabalho e emprego.

É imperativo, portanto, que as políticas de equiparação salarial sejam ampliadas para incluir pessoas com deficiência – e que o Ministério do Trabalho, lute e zele pelos direitos das pessoas com deficiência, reconhecendo suas contribuições e garantindo que recebam remuneração justa por seu trabalho. Isso não apenas promoverá um ambiente mais inclusivo, mas também reforçará os princípios fundamentais de justiça e igualdade no local de trabalho.

Completamos esse ano 33 anos de Lei de Cotas e uma luta baseada nos direitos das pessoas com deficiência, sendo essa legislação celebrada internacionalmente e, no próprio Brasil um grupo do Ministério de Trabalho que deveria proteger esse direito, trabalha para flexibilizar essa lei prejudicando as condições de contratação dessas pessoas? Pergunto: seria esse mesmo o caminho à seguir?

A Agenda 2030 é composta por 17 metas – os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e uma delas dentro do ODS 10 – Redução das Desigualdades é “Até 2030, empoderar e promover a inclusão social, econômica e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência, raça, etnia, origem, religião, condição econômica ou outra”. A legislação também segue a mesma linha acordada pela Convenção 100 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O documento, chamado “Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres Trabalhadores por Trabalho de Igual Valor”, vigora no país desde 1958.

É crucial que a garantia de participação ativa de representantes sindicais e dos próprios trabalhadores com deficiência na elaboração e execução de planos de ação que vislumbrem seus direitos. Essa colaboração é a tão sonhada co-construção com todos os atores envolvidos.

Considero essencial adotar todos esses pontos em programas de diversidade, equidade, inclusão e pertencimento que implantei e sigo implementando, em grandes organizações. Essas medidas, visam garantir que as propostas sejam eficazes e reflitam as necessidades e preocupações reais dos envolvidos, impactando diretamente suas vidas profissionais e pessoais. Portanto, as pessoas com deficiência deveriam estar contempladas na Lei nº 14.611 de 03 de Julho de 2023, que busca corrigir eventuais inequidades salariais para promover a isonomia salarial.

Compartilhar:

É sócio e COO da Egalite, conselheiro do Instituto EY e da Handtalk, psicólogo, comunicador e docente dos MBAs de Recursos Humanos e Desenvolvimento de Gestores da FGV, professor da Fundação Dom Cabral, HSM University, Escola de Comunicação ABERJE e da Pós-graduação em Cuidados Paliativos do Hospital Sírio-Libanês. É CEO da REIS - Rede Empresarial de Inclusão Social. Representa o Brasil anualmente na conferência internacional da OIT em Genebra sobre inclusão da pessoa com deficiência e o futuro do trabalho.

Artigos relacionados

Marketing & growth
21 de outubro de 2025
O maior risco do seu negócio pode estar no preço que você mesmo definiu. E copiar o preço do concorrente pode ser o atalho mais rápido para o prejuízo.

Alexandre Costa - Fundador do grupo Attitude Pricing (Comunidade Brasileira de Profissionais de Pricing)

5 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde
20 de outubro de 2025
Nenhuma equipe se torna de alta performance sem segurança psicológica. Por isso, estabelecer segurança psicológica não significa evitar conflitos ou suavizar conversas difíceis, mas sim criar uma cultura em que o debate seja aberto e respeitoso.

Marília Tosetto - Diretora de Talent Management na Blip

4 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Marketing & growth
17 de outubro de 2025
No Brasil, quem não regionaliza a inovação está falando com o país certo na língua errada - e perdendo mercado para quem entende o jogo das parcerias.

Rafael Silva - Head de Parcerias e Alianças na Lecom

3 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde, Tecnologia & inteligencia artificial
16 de outubro de 2025
A saúde corporativa está em colapso silencioso - e quem não usar dados para antecipar vai continuar apagando incêndios.

Murilo Wadt - Cofundador e diretor geral da HealthBit

3 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde
15 de outubro de 2025
Cuidar da saúde mental virou pauta urgente - nas empresas, nas escolas, nas nossas casas. Em um mundo acelerado e hiperexposto, desacelerar virou ato de coragem.

Viviane Mansi - Conselheira de empresas, mentora e professora

3 minutos min de leitura
Marketing & growth
14 de outubro de 2025
Se 90% da decisão de compra acontece antes do primeiro contato, por que seu time ainda espera o cliente bater na porta?

Mari Genovez - CEO da Matchez

3 minutos min de leitura
ESG
13 de outubro de 2025
ESG não é tendência nem filantropia - é estratégia de negócios. E quando o impacto social é parte da cultura, empresas crescem junto com a sociedade.

Ana Fontes - Empreendeedora social, fundadora da Rede Mulher Empreendedora (RME) e do Instituto RME

3 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Estratégia
10 de outubro de 2025
Com mais de um século de história, a Drogaria Araujo mostra que longevidade empresarial se constrói com visão estratégica, cultura forte e design como motor de inovação.

Rodrigo Magnago

6 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Liderança
9 de outubro de 2025
Em tempos de alta performance e tecnologia, o verdadeiro diferencial está na empatia: um ativo invisível que transforma vínculos em resultados.

Laís Macedo, Presidente do Future is Now

3 minutos min de leitura
Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Bem-estar & saúde, Finanças
8 de outubro de 2025
Aos 40, a estabilidade virou exceção - mas também pode ser o início de um novo roteiro, mais consciente, humano e possível.

Lisia Prado, sócia da House of Feelings

5 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)