Cultura organizacional, Bem-estar & saúde, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
2 minutos min de leitura

Quando o luto atravessa as portas das empresas

O luto não pede licença - e também acontece dentro das empresas. Falar sobre dor é parte de construir uma cultura organizacional verdadeiramente humana e segura.
Virgínia Planet é sócia, porta-voz da House of Feelings e atua como facilitadora em processos de transformação humana e organizacional. Com foco no desenvolvimento de pessoas e na integração entre emoções, liderança e cultura corporativa, promove diálogos que aproximam a gestão da dimensão humana nas empresas.

Compartilhar:


Falar sobre luto ainda é desconfortável. No ambiente corporativo, então, o silêncio costuma ser ainda maior. Entre metas, reuniões e prazos, esquecemos que a vida – e também a morte – não pedem licença para entrar. E quando entram, não há planejamento estratégico capaz de nos preparar.

Nos últimos meses, vivemos situações que nos lembraram disso com força. Estivemos presentes quando um funcionário faleceu a bordo de uma embarcação, acolhendo líderes e equipe que, isolados em alto-mar, precisavam encontrar palavras, gestos e força para seguir até seu desembarque. Acompanhamos também uma equipe diante da notícia de que um colega entraria em cuidados paliativos, ajudando-os a se preparar para uma despedida inevitável, mas carregada de afeto. E estivemos lado a lado de um líder que perdeu o filho para o suicídio – acolhendo não apenas ele, mas também sua equipe e família, em um momento de dor tão profunda que qualquer frase pronta pareceria pequena demais.

Essas experiências nos mostraram, mais uma vez, o quanto ainda não estamos preparados para lidar com o luto nas empresas. Quando a perda acontece, ela não fica do lado de fora. Ela senta nas cadeiras das reuniões, ocupa os corredores, interfere no ritmo, no olhar, na energia. O luto muda a atmosfera, mesmo quando não é nomeado.

E é justamente aí que mora a importância de criar espaços seguros de escuta. Lugares onde seja possível falar sobre o sofrimento, colocar a dor em palavras, permitir que o silêncio também seja um diálogo. Porque o luto não é ausência de vida – é parte dela.

Segundo estudos internacionais, quase um em cada nove profissionais enfrenta a perda de alguém próximo todos os anos. Metade deles deixa o emprego em até doze meses, muitas vezes por não encontrar apoio. E mais do que um número, isso é um retrato do quanto ignorar a dor no trabalho custa caro: não apenas em produtividade, mas em humanidade.

Por isso, contar com profissionais preparados – especialmente de fora da organização – é tão importante. Estar de fora permite escutar sem estar atravessado pelos vínculos e pela cultura interna. Permite oferecer presença segura, acolher sem projetar, sustentar o que precisa ser dito e, às vezes, apenas estar ali. Elisabeth Kübler-Ross, J. William Worden e, no Brasil, Maria Helena Franco nos lembram que o luto é singular, mas torna-se menos pesado quando é compartilhado.

Falar sobre luto nas empresas não é abrir espaço para tristeza sem fim. É abrir espaço para humanidade. É dizer: “Você não precisa passar por isso sozinho.” É compreender que cuidar de pessoas também significa estar presente nos momentos mais delicados, com a mesma atenção e compromisso que temos nos momentos de celebração.

Porque, no fim, é a forma como acolhemos a dor que revela a verdadeira força de uma cultura organizacional.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Quando o colaborador é o problema

Ambientes tóxicos nem sempre vêm da cultura – às vezes, vêm de uma única pessoa. Entenda como identificar e conter comportamentos silenciosos que desestabilizam equipes e ameaçam a saúde organizacional.

Empreendedorismo
Embora talvez estejamos longe de ver essa habilidade presente nos currículos formais, é ela que faz líderes conscientes e empreendedores inquietos

Lilian Cruz

3 min de leitura
Marketing Business Driven
Leia esta crônica e se conscientize do espaço cada vez maior que as big techs ocupam em nossas vidas

Rafael Mayrink

3 min de leitura
Empreendedorismo
Falta de governança, nepotismo e desvios: como as empresas familiares repetem os erros da vilã de 'Vale Tudo'

Sergio Simões

7 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Já notou que estamos tendo estas sensações, mesmo no aumento da produção?

Leandro Mattos

7 min de leitura
Empreendedorismo
Fragilidades de gestão às vezes ficam silenciosas durante crescimentos, mas acabam impedindo um potencial escondido.

Bruno Padredi

5 min de leitura
Empreendedorismo
51,5% da população, só 18% dos negócios. Como as mulheres periféricas estão virando esse jogo?

Ana Fontes

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Marcelo Murilo

7 min de leitura
ESG
Projeto de mentoria de inclusão tem colaborado com o desenvolvimento da carreira de pessoas com deficiência na Eurofarma

Carolina Ignarra

6 min de leitura
Saúde mental, Gestão de pessoas
Como as empresas podem usar inteligência artificial e dados para se enquadrar na NR-1, aproveitando o adiamento das punições para 2026
0 min de leitura
ESG
Construímos um universo de possibilidades. Mas a pergunta é: a vida humana está realmente melhor hoje do que 30 anos atrás? Enquanto brasileiros — e guardiões de um dos maiores biomas preservados do planeta — somos chamados a desafiar as retóricas de crescimento e consumo atuais. Se bem endereçados, tais desafios podem nos representar uma vantagem competitiva e um fôlego para o planeta

Filippe Moura

6 min de leitura