Economia do cuidado

Você sabia que a economia do cuidado banca o seu negócio?

Sem esse trabalho invisível e desvalorizado, a economia e a sociedade colapsariam
Leandro Ziotto é fundador da 4daddy e pesquisador e consultor em Parentalidades, Masculinidades, Equidade de Gênero e Economia do Cuidado.

Compartilhar:

No dicionário, “economia” é a “ciência que analisa e estuda os mecanismos referentes à obtenção, à produção, ao consumo e à utilização dos bens materiais necessários à sobrevivência e ao bem-estar”.

Para os economistas clássicos, como Adam Smith, David Ricardo e John Stuart Mill, ela é o estudo do processo de produção, distribuição, circulação e consumo dos bens e serviços (riqueza). Já para Marx, a economia clássica coloca o trabalho como elemento criador de riqueza.

Resumindo de forma simplista: __a economia é um conjunto de regras que organiza a forma como vivemos em sociedade.__

Porém, existe uma atividade no meio dessa economia que é essencial, pois sem ela não há sociedade que pare de pé. Essa atividade, desvalorizada e majoritariamente exercida por mulheres, se chama “economia do cuidado”.

Não falo aqui do cuidado romântico, como ato de amor e afeto. Falo do cuidado que nos mantém vivos e saudáveis para sermos economicamente produtivos.

Porém, não aprendemos a olhar e entender esse cuidado como uma tecnologia, que pode ser aprendida e ensinada – como já é feito em escolas na Espanha e no Japão. Saber cuidar de nós, de alguém e de algo é fundamental. Nunca se falou tanto de saúde mental: mesmo que a academia e muitos especialistas levantem essa pauta há décadas, só agora, que ela atingiu os indicadores financeiros das empresas e começou a ser valorizada.

Cuidar de algo como a sua casa, do seu local de trabalho e do próprio planeta tem ganhado espaço na mídia e nas discussões sociais. A pandemia deu ainda mais seriedade ao tema, com tanta gente trancafiada em casa precisando cuidar de coisas que, até então, eram função de outra pessoa.

A economia do cuidado vem sendo estudada na academia há alguns anos. A ONG [Think Olga](https://lab.thinkolga.com/economia-do-cuidado/) fez um trabalho incrível que mostra a invisibilidade do trabalho do cuidado das mulheres e como elas sustentam a economia e nossa sociedade. A consultoria [4daddy](https://4daddy.com.br/), em 2020, lançou o estudo [“Pais em Casa”](https://www.paisemcasa.4daddy.com.br/), que também joga luz ao assunto e chama a atenção para incluir os homens na equação.

O raciocínio para entender o que é economia do cuidado é bem simples. Se eu, que estou escrevendo esse texto, e você, que está me lendo, somos adultos economicamente produtivos é porque somos adultos saudáveis. Se somos adultos saudáveis, é porque uma pessoa ou um grupo de pessoas dedicaram décadas ao nosso cuidado. É algo que você, eu, no fim das contas, as empresas em que trabalhamos e a sociedade tiram proveito.

Sem adultos saudáveis física, emocional e mentalmente, não há sociedade organizada e não há economia sustentável. A economia do cuidado não subsidia apenas a economia tradicional, como também subsidia o seu negócio.

Comércio, indústria e agronegócio não existiriam. O seu negócio, por mais tecnológico que seja, por mais algoritmos e inteligência artificial que use, é feito por seres humanos. Não à toa economia é uma matéria de humanas, não de exatas. Temos que colocar o ser humano na equação, mas, nas últimas décadas, aprendemos a excluir o ser humano na conta.

Segundo a Think Olga, o trabalho do cuidado no Brasil equivale a 11% do PIB. É mais que o dobro que todo o setor agropecuário. O trabalho não pago do cuidado, feito majoritariamente por mulheres, representa uma economia 24 vezes maior que a do Vale do Silício.

As metas de equidade de gênero, tão divulgadas por empresas, passam necessariamente pela valorização do trabalho do cuidado, pela implementação de uma política parental séria que vá além da equiparação das licenças.

O relatório [“Parentalidades nas Empresas”](http://www.familytalks.org/parentalidade/relatorio.html), lançado em abril, organizado pelo [4daddy](https://4daddy.com.br/) e [Family Talks](https://familytalks.org/site2022/), revelou obstáculos e oportunidades para empresas garantirem tempo para seus colaboradores poderem se dedicar às atividades de cuidado. A pesquisa aponta a necessidade de ampliar a divulgação sobre o Programa Empresa Cidadã e destacou a importância de medidas de conciliação do trabalho com a vida pessoal.

Os pesquisadores apontam para a necessidade de ampliar o envolvimento das empresas com esse debate. Por exemplo, por meio de ações de conscientização para seus colaboradores e treinamento dos gestores. Além disso, é fundamental ampliar o diálogo sobre o cuidado na sociedade, com atenção em fomentar o envolvimento dos homens nessas tarefas.

Termino meu texto de hoje com uma curiosidade que aprendi com meu colega Henrique Katahira, sócio e facilitador da consultoria Cuidadoria: “A palavra ‘economia’, etimologicamente falando, vem de ‘Eco’, casa, e ‘nomia’, gerir e cuidar. Então, uma nova economia não será construída apenas por engenheiros e economistas, mas também por cuidadores”.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Homo confusus no trabalho: Liderança, negociação e comunicação em tempos de incerteza

Em um mundo sem mapas claros, o profissional do século 21 não precisa ter todas as respostas – mas sim coragem para sustentar as perguntas certas.
Neste artigo, exploramos o surgimento do homo confusus, o novo ser humano do trabalho, e como habilidades como liderança, negociação e comunicação intercultural se tornam condições de sobrevivência em tempos de ambiguidade, sobrecarga informacional e transformações profundas nas relações profissionais.

Bem-estar & saúde
7 de novembro de 2025

Luciana Carvalho - CHRO da Blip, e Ricardo Guerra - líder do Wellhub no Brasil

4 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
6 de novembro de 2025
Incluir é mais do que contratar - é construir trajetórias. Sem estratégia, dados e cultura de cuidado, a inclusão de pessoas com deficiência segue sendo apenas discurso.

Carolina Ignarra - CEO da Talento Incluir

5 minutos min de leitura
Liderança
5 de novembro de 2025
Em um mundo sem mapas claros, o profissional do século 21 não precisa ter todas as respostas - mas sim coragem para sustentar as perguntas certas. Neste artigo, exploramos o surgimento do homo confusus, o novo ser humano do trabalho, e como habilidades como liderança, negociação e comunicação intercultural se tornam condições de sobrevivência em tempos de ambiguidade, sobrecarga informacional e transformações profundas nas relações profissionais.

Angelina Bejgrowicz - Fundadora e CEO da AB – Global Connections

12 minutos min de leitura
Bem-estar & saúde
4 de novembro de 2025

Tatiana Pimenta - Fundadora e CEO da Vittude

3 minutos min de leitura
Liderança
3 de novembro de 2025
Em um mundo cada vez mais automatizado, liderar com empatia, propósito e presença é o diferencial que transforma equipes, fortalece culturas e impulsiona resultados sustentáveis.

Carlos Alberto Matrone - Consultor de Projetos e Autor

7 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
1º de novembro de 2025
Aqueles que ignoram os “Agentes de IA” podem descobrir em breve que não foram passivos demais, só despreparados demais.

Atila Persici Filho - COO da Bolder

8 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
31 de outubro de 2025
Entenda como ataques silenciosos, como o ‘data poisoning’, podem comprometer sistemas de IA com apenas alguns dados contaminados - e por que a governança tecnológica precisa estar no centro das decisões de negócios.

Rodrigo Pereira - CEO da A3Data

6 minutos min de leitura
Inovação & estratégia, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
30 de ouutubro de 2025
Abandonando o papel de “caçador de bugs” e se tornando um “arquiteto de testes”: o teste como uma função estratégica que molda o futuro do software

Eric Araújo - QA Engineer do CESAR

7 minutos min de leitura
Liderança
29 de outubro de 2025
O futuro da liderança não está no controle, mas na coragem de se autoconhecer - porque liderar os outros começa por liderar a si mesmo.

José Ricardo Claro Miranda - Diretor de Operações da Paschoalotto

2 minutos min de leitura
Inovação & estratégia
28 de outubro 2025
A verdadeira virada digital não começa com tecnologia, mas com a coragem de abandonar velhos modelos mentais e repensar o papel das empresas como orquestradoras de ecossistemas.

Lilian Cruz - Fundadora da Zero Gravity Thinking

4 minutos min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #169

TECNOLOGIAS MADE IN BRASIL

Não perdemos todos os bondes; saiba onde, como e por que temos grandes oportunidades de sucesso (se soubermos gerenciar)